A Justiça do Mato Grosso determinou na última quinta-feira (28) a mudança de nome e de gênero para o feminino nos documentos de uma criança transexual de 9 anos de idade.
Segundo decisão do juiz Anderson Candiotto, "a personalidade da criança, seu comportamento e aparência remetem, imprescindivelmente, ao gênero oposto de que biologicamente possui, conforme se pode observar em todas as avaliações psicológicas e laudos proferidos pelo Ambulatório Transdisciplinar de Identidade de Gênero e Orientação Sexual, do Instituto de Psiquiatria, do Hospital das Clínicas de São Paulo, evidenciando a preocupação dos pais em buscar as melhores condições de vida para a criança".
Trata-se da estudante Luiza, de 9 anos, que antes se chamava Leandro. Ela é a primeira criança transexual do Brasil a receber essa autorização da Justiça. A pedido da família os nomes utilizados são ficticios para preservar suas identidades.
A história da garota e de mais outros adolescentes atendidos no Hospital das Clínicas foi tema de reportagem de capa da revista VEJA SÃO PAULO em julho de 2015. Segundo a família, a revista foi anexada ao processo e ajudou a acelerar a decisão.
A repórter Adriana Farias encontrou com a família em um hotel em São Paulo na noite de sexta-feira (29). Moradora de outro estado, Luiza viaja para a capital paulistana esporadicamente para visitar o ambulatório do Hospital das Clínicas.
Usando uma blusinha vermelha de babado na gola, shorts e cabelos compridos ultrapassando os ombro presos com um pequeno lacinho, a menina estava radiante. "Agora, não vou ter mais problemas nas chamadas na escola, às vezes me chamavam pelo nome masculino, no postinho de saúde e nas viagens, e era sempre era aquele zum zum zum quando olhavam para mim e para o meu documento", conta ela, enquanto acariciava o cabelo de uma boneca do personagem Ariel, da Disney. "Eu me sentia muito mal, mas agora isso vai mudar."
O pai Antonio, sargento aposentado do Exército, vibrava de emoção. "Foram três anos de batalha na Justiça eu ia direto no fórum cobrar uma resposta e os documentos sempre estavam na mesa do juiz para decidir", conta. "Assim que saiu a reportagem da Vejinha, o nosso defensor público anexou-a junto ao processo, o que ajudou a acelerar porque foi a maior repercussão entre os magistrados. O juiz conversou com a Luiza no mês seguinte à publicação da matéria", relata.
"Agora que deu certo a felicidade é muito grande, já imagino quando ela for arrumar emprego ou casar vai ser tudo mais fácil", completa a mãe Beatriz. "A gente ficou surpreso porque nem transexuais adultos, que estão há anos tentando na Justiça, conseguiram o que ela conseguiu"
Os detalhes da primeira consulta no Hospital das Clínicas (HC) não escapam da memória de Beatriz. O comportamento feminino do mais novo de seus dois filhos fez com que ela e o marido buscassem ajuda no Ambulatório Transdisciplinar de Identidade de Gênero e Orientação Sexual. Eles carregaram fotos de Leandro, então com 4 anos e 10 meses, em diversas situações: em algumas, usando os trajes de garoto presentes em seu guarda-roupa e, em outras, peças e maquiagens encontradas no armário da mãe. Na triagem, o psiquiatra Alexandre Saadeh apontou para uma imagem do caçula em trajes masculinos e perguntou a ele: "Quem é nessa foto?". A resposta veio na lata: "Sou eu vestida de menino".
Era o início de um acompanhamento psiquiátrico e psicológico de longa duração, precedido por anos de angústia para a família, que tentou de castigos a artifícios religiosos a fim de forçá-lo a assumir o gênero com o qual veio ao mundo. Ele tinha sinais de depressão, agressividade e não queria mais sair de casa. Veio a difícil decisão: os pais passaram a criá-lo como ele sempre quis, com o nome de Luiza. Aos 9 anos, ela está prestes a se tornar a primeira criança com fortes indicativos de transexualidade a tomar medicamentos com o objetivo de bloquear a puberdade masculina e incentivar a feminina, como o nascimento de seios.
"PRÍNCIPE NÃO. EU SOU UMA PRINCESINHA"
Na reportagem de capa de julho de 2015, a família deu o seguinte depoimento à VEJA SÃO PAULO:
"Eu dizia: lsquoVem ca, príncipe da mamãe’. E o Leandro* retrucava: "Não é príncipe. É princesinha!’thinsp", relata Beatriz, de 36 anos. Tudo começou quando ele tinha 2 anos. O menino pegava as presilhas das coleguinhas da creche e ajustava em seus fios loiros. Colocava blusas para usá-las como vestidos, amarradas com um cinto. "Para mim, era uma fase que ia passar", lembra o pai, Antônio, sargento aposentado do Exército. A feminilidade do garoto, porém, só se acentuava, e as broncas resultavam em lágrimas. A família decidiu, então, buscar a ajuda de um pastor evangélico. A instrução foi reprimir ao máximo a conduta da criança e murmurar longas sequências de orações ao pé do ouvido enquanto ela dormisse, para expulsar "o inimigo" (ou seja, o demônio) de sua cabeça.
Três meses se passaram, e o inferno na casa só se agravava. "De repente, tínhamos ali um filho em depressão, agressivo, piorando na escola", afirma o militar. Repreendido, Leandro fazia tudo às escondidas. Colocava pregadores de roupa nos cabelos para simular longas madeixas, escondia a genitália ao entrar no banho. Chegou a pegar uma tesoura para cortar o órgão. O ato foi rapidamente contido pela mãe, que procurou em sites de busca expressões como "mente feminina em corpo masculino". Encontrado na internet, o documentário americano Meu Eu Secreto traduziu a situação. Os pais fizeram então um trato com a criança: em casa ela podia andar de calcinha e vestido, mas fora dali seria menino. Não deu certo. Em uma ocasião, um amigo da família entrou na residência de moto, sem avisar. A garota estava no quintal e correu para se esconder atrás da churrasqueira, onde ficou por uma hora, tremendo de medo.
"Naquele dia, eu assumi: ela vai ser o que ela é, não importa o que pensem", diz a mãe. Quando descobriu o ambulatório do Hospital das Clínicas, Beatriz ligou para lá aos prantos, pedindo "pelo amor de Deus" que a atendessem. Ali, os pais de Leandro foram orientados a não repreender nem incentivar o comportamento dele. Com o tempo, consolidou-se na criança a identidade feminina, de forma muito evidente. No primeiro passeio na rua como garota, Antônio precisou encorajá-la (e a si mesmo) aperder o receio dos olhares.
Com o nome social de Luiza, 9 anos, ela foi matriculada em uma escola pública (uma particular a barrou, temendo afugentar a clientela), onde apenas professores sabem de sua história. "Fui muitas vezes acusada de querer transformar minha filha", lamenta Beatriz. Ela e o marido se afirmam felizes sobre as escolhas da caçula (eles também são pais de um garoto de 10 anos) e se preparam para as próximas fases que Luiza terá de enfrentar: tomar medicamentos para bloquear a puberdade masculina e, no futuro, outros para reforçar os traços femininos. Luiza se diz contente. "Agora me sinto uma menina inteira", sorri. "Meu único medo é minhas amigas deixarem de falar comigo se um dia descobrirem que eu já fui menino."
Corregedor do CNJ extrapola poder em suspensão de perfis de juízes das redes sociai...
STF decreta prisão preventiva de investigados por vandalismos, violência e atos ant...
Medida provisória zera PIS e Cofins do setor aéreo...
Comissão do Senado debate e aprova sugestões de mudanças no rito, no alcance e nos ...
STF inicia julgamento sobre regra que posiciona membro do MP ao lado do juiz...
Lei de Direitos Autorais não se aplica à criação de formato gráfico para buscas na ...
Câmara Municipal de Salvador não pode reeleger os seus dirigentes mais de uma vez, ...
Ministro Barroso suspende eficácia imediata do piso salarial da enfermagem e pede e...
Efeitos da reforma da Previdência repercutem no Orçamento do ano que vem...
Supremo retoma sessões plenárias com sessão nesta segunda-feira, às 15h...
STF decide que recebimento de honorários por procuradores de SP deve observar teto ...
Ministro André Mendonça define que ICMS dos combustíveis deve adotar cobrança unifo...
STF afasta incidência do IR sobre pensões alimentícias decorrentes do direito de fa...
Ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, do STF, confirma participação na mesa de encer...