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A polêmica do UBER: uma resumida análise jurídica e econômica da atividade

ANO 2016 NUM 221
Rodrigo Pironti (PR)
Pós-Doutor em Direito pela Universidad Complutense de Madrid. Doutor e Mestre em Direito Econômico pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Advogado e parecerista.


27/07/2016 | 6882 pessoas já leram esta coluna. | 18 usuário(s) ON-line nesta página

As cidades modernas experimentam recentemente um grande embate gerado por defensores do UBER (e de outros aplicativos semelhantes) e representantes e  simpatizantes da categoria dos taxistas.

Naturalmente, pelos interesses envolvidos, boa parte das discussões passa ao largo de uma análise realmente crítica e fundamentada da questão.

Pois bem, ao que parece, é necessário – mesmo que em breves linhas –  se delimitar qual  a atividade prestada pelos taxistas, qual a atividade exercida pelos motoristas do UBER (e outros aplicativos) e o que se pretende com a versada regulamentação da matéria em algumas cidades brasileiras.

Veja que o serviço de transporte público de passageiros está regulado pela Lei Federal n. 12.468/11, que em seu artigo 2o deixa evidente que “é atividade privativa dos profissionais taxistas a utilização de veículo automotor, próprio ou de terceiros, para o transporte público individual remunerado de passageiros”. Não há duvida, portanto, de que o transporte público de passageiros (serviço público dependente de permissão por meio de licitação), deve ser prestado pelos taxistas e regulado (controlado) pelos Municípios. Essa é a natureza jurídica da atividade.

Ocorre que a Lei Federal 12.587/12, que institui as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana, prevê expressamente outro tipo de modal para o transporte individual de passageiros, quando em seu artigo 3o , parágrafo 2o , inciso III,  literalmente ressalva que “os serviços de transporte urbano são classificados, [...] quanto à natureza do serviço:” em “a) público; b) privado”.

Nitidamente a opção legislativa está a se referir a um outro modal, não vinculado a prestação da atividade de taxista (serviço público em razão de sua natureza), mas outra atividade, que neste caso pode ser exemplificada com a designação de UBER (ou qualquer outra empresa que explore este tipo de atividade econômica).

É dizer, os taxistas e os motoristas privados do UBER não estão na mesma categoria jurídica, e, portanto, são submetidos a regimes jurídicos diversos, o que por si só, já seria tendente a desmistificar e acautelar as discussões e embates – muitas vezes físicos – dos defensores de ambas as atividades.

Reconhecida a natureza jurídica diversa do serviço e, portanto, os regimes jurídicos aplicados a cada uma das atividades, importante uma segunda análise, qual seja, a de necessidade de regulamentação da atividade.

O interesse público local e a própria Política Nacional de Mobilidade Urbana evidenciam a necessidade de regulação municipal da atividade.

O artigo 12 (doze) da Política Nacional de Mobilidade Urbana, ressalta que “os serviços de utilidade pública de transporte individual de passageiros deverão ser organizados, disciplinados e fiscalizados pelo poder público municipal, com base nos requisitos mínimos de segurança, de conforto, de higiene, de qualidade dos serviços e de fixação prévia dos valores máximos das tarifas a serem cobradas”. É em razão da prestação do serviço público que os taxistas sofrem forte controle estatal, sem que com isso, haja qualquer ilegalidade. Ao contrário, isso é típico da atividade por eles exercida.

Em contrapartida, a exploração de atividade econômica realizada pelo UBER (ou outro aplicativo), a par de seu regime constitucional de livre concorrência e menor intervenção estatal, não pode desconsiderar as regras de isonomia e lealdade concorrencial, bem como e analogicamente, também deve sofrer regulação pelos Municípios, detentores da competência de ponderação dos interesses locais e de convivência harmônica de ambos os modais.

É exatamente aqui que reside o ponto central desta breve e resumida análise. A regulamentação isonômica da atividade deve considerar não só os relevantes aspetos de qualidade e eficiência da prestação de transporte individual público (taxistas) ou privado (UBER), ou ainda, critérios objetivos de demanda sob pena do exercício predatório de ambas as prestações; mas principalmente a incidência proporcional (em razão da natureza do serviço) das obrigações, restrições e tributos incidentes sobre estas atividades, que no caso do UBER, por exemplo, impõe inclusive a cobrança de ISS em razão do seu exercício de livre atividade econômica.

Enfim, é preciso equalizar os interesses em jogo e os acirrados ânimos de ambos os “lados” para se entender que, por lei, atividades com natureza diversa podem e devem conviver harmonicamente, mas para isso é necessária uma postura isonômica e concreta da Administração Pública que, afinal, titulariza a solução dos interesses conflitantes e o alcance máximo do interesse público.



Por Rodrigo Pironti (PR)

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