Phillip Gil França (PR)
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Precisamos de um Estado?
Queremos um Estado só para nós?
Ao pensar no Estado, na verdade, pensamos em nós mesmos.
Como queremos viver; qual a melhor forma de promover nosso desenvolvimento no ambiente onde fomos inseridos; como nos proteger das ameaças cotidianas; dentre tantas outras preocupações e considerações sobre o que somos e o que queremos ser.
Ou seja, considerar o Estado em nossas vidas é aceitar que não estamos ´sós´ neste ´tempo e espaço´ oferecidos para vivermos.
Desse modo, ao pensar no Estado, na verdade, pensamos em uma realidade além do ´nós´, mas, também, no universo dos ´outros´.
Não temos a opção de lembrar do ´eu´ refletido no espelho sem sopesar que essa criação involuntária precisa ser comparada com tantas outras que nos cercam.
Inexiste determinação de ´vida´ em sua singularidade, mas, sim, a partir da consideração de uma série de eventos causais que levam aquele indivíduo surgir como elemento de interação com tantos outros, de maneira individual e coletiva.
Nessa perspectiva, refletir sobre a nossa existência é, necessariamente, lembrar que só nos realizamos a partir da oposição do ´outro´. Isso porque, da consideração do que ´não somos´, estabelecemos parâmetros e metas do que ´somos´ e queremos ser.
Assim, se há uma dificuldade de considerar o complexo de causalidades que justificam nossa presença ´aqui´ e ´agora´, aparentemente, faz-se possível delimitar estruturas existenciais que nos identificam, bem como, metas realizáveis e utópicas que nutrem o nosso desenvolvimento.
E é a partir desse jogo do que ´sou´ e do que ´posso ser´, externado de forma intersubjetiva, na compreensão de que ´nós existimos´, ou melhor, ´coexistimos´, que uma necessária estruturação de limitadores de conduta precisa ser estabelecida, o ´Estado´.
Essa lógica é exaltada por um motivo muito simples: o ´nós´, sem identificação do ´eu´ e do ´tu´ traz a confusão do ´sou´ com o ´somos´, fato que mistura a capacidade autodestrutiva do ser humano para o seu desenvolvimento subjetivo, de forma intersubjetiva.
Basicamente, o que se busca individualmente para alcançar ser uma pessoa cada dia melhor, confunde-se com o que se busca para compartilhar uma sociedade cada vez melhor.
Tal confusão, sem fronteiras claras do que é ´bom´ e ´ruim´, para cada um e para todos, torna a busca do desenvolvimento – individual e estatal – irreal e destrutiva para os cidadãos que coexistem nesse mesmo ambiente temporal e espacial.
Isso porque, parte-se da premissa de que a destruição (sustentável) é o preço do desenvolvimento.
A autodestruição e a sustentável regeneração das agressões que causamos em nós mesmos, para o nosso desenvolvimento, superando dificuldades e conquistando novos patamares de realização, traz ao ser humano uma evolução natural individual e, por consequência, do grupo social onde está inserido.
Entretanto, a soma de autodestruições individuais, interpostas em um determinado grupo social, em nome do desenvolvimento intersubjetivo, não pode ter como resultado a destruição coletiva.
Como lidar com esse Estado, então, que regula as destruições intersubjetivas em nome de um desenvolvimento comum?
A sugestão primária indicada é a do ´Estado Necessário´, como aquele que cuida mais de quem possui menor capacidade de autorregular a própria ´destruição-desenvolvimentista´ e, assim, concretamente representa uma ameaça ao desenvolvimento do grupo.
Esse mesmo ´Estado Necessário´, por outro lado, é aquele que intervém menos naqueles que melhor manejam sua capacidade destrutiva para uma melhor evolução individual e daqueles que os cercam.
Porém, adaptar e readaptar o Estado para atender mais ou atender menos indivíduos é algo difícil de concretizar.
A linha objetiva de considerar todos como ´iguais´, quando equivalentes, e ´desiguais´, nos limites dessas desigualdades, deixa o Estado com brechas de efetividade, muitas vezes, inaceitáveis, pois impedem a superação de falhas que agridem direitos fundamentais dos cidadãos.
Basicamente, o grande problema de tal realidade é que tais falhas afastam o Estado do seus objetivos fundamentais estabelecidos no art. 3º da CF/88: “Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: i - construir uma sociedade livre, justa e solidária; ii- garantir o desenvolvimento nacional; iii- erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; iv- promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.
Na prática, objetivar as relações do Estado com o cidadão, com um viés de ´otimilidade administrativa´, ao afastar um mínimo de filtragem subjetiva, própria da consideração de que o ´homem´ age em nome e para o outro ´homem´, com ´ferramentas estatais´, torna o Estado menos justo, solidário e útil para esse ´homem´ que abriu mão de parte de sua condição de ´individuo absoluto´ para ser um ´cidadão delimitado´ pelas liberdades interpostas de outros cidadãos e de uma força externa que determina quem esse cidadão deve ser e como deverá caminhar para continuar útil para o tal Estado que criou.
Essa utilidade do cidadão é que justifica a existência do Estado.
Paradoxalmente, sem um ´cidadão útil´, um ´Estado eficaz´ não se sustenta e sem um ´Estado eficaz´ em suas tarefas, de forma ´proporcional, sustentável e necessária´, não se pode verificar um ´cidadão útil´.
Mas, quem é o ´cidadão útil´?
É aquele que tem consciência que se ´é´ e ´existe´ assim ocorre porque aceita o ´outro´ coexistindo consigo e que tal interação é o caminho que levará todos ao desiderato comum de seres melhores em um utópico amanhã sempre positivamente renovado.
Se esse amanhã virá é a grande chave da vida e da justificativa de nutrição do Estado que conhecemos.
Como esse ´amanhã´ virá, sabidamente, depende de como alimentamos o Estado ´hoje´, com as lições já recebidas ´ontem´.
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