Phillip Gil França (PR)
Não desvie do caminho, afirmou Mestre Confúcio (Os Analectos, 2009) e popularizou Frank Baum na fábula do Mágico de OZ. Referiam-se ao caminho que leva sempre a algo melhor do que se tinha, coberto por aprendizados essenciais para a elevação da alma humana.
Ponderaram sobre o caminho que apresenta uma série de desafios a serem superados para tornar aquele que o trilha uma pessoa melhor.
E o que move as pessoas nos caminhos que as tornam melhores? De forma geral, é a convicção desenvolvimentista – ou o acreditar no ser e viver melhor – envolta nos ladrilhos desse caminho.
Ou seja, os homens precisam acreditar que tudo o que virá será melhor do que já passou. E essa convicção na possibilidade de ser, fazer e ter algo melhor é um dos principais combustíveis viabilizadores da interação do homem consigo e com o meio onde vive. Compreende-se, dessa maneira, que a busca do desenvolvimento intersubjetivo é bioticamente (sim, de todos os seres vivos entre si) inevitável, pois precisam constantemente promover adaptações às alterações do meio onde vivem, conforme uma simplificada visão da teoria de Darwin.
Nesta linha, faz-se necessário refletir como essa convicção (crença) desenvolvimentista influencia o Direito (considerando sua marcante característica de ser uma ciência integralmente dependente da vontade humana) e como o homem se relaciona com o ambiente a sua volta.
Isto porque, diferente de outras ciências, tem-se no Direito uma racionalização da vontade do homem para atender a uma chamada legítima vontade humana, como aquela intersubjetivamente aceita, mas carente de força coercitiva externa para ser seguida por uma determinada sociedade.
Ou seja, a partir do Direito faz-se uma verdadeira gestão da vontade humana intersubjetiva para o alcance do interesse comum, por meio de determinada regulação das atividades do homem. E, quando se refere ao universo comum (sociedade) a ser tutelado pelo Estado, propõe-se investigar a influência da convicção jurídica no modo e alcance de uma necessária gestão pública (na intensidade proporcional à crença que se tem no Sistema estatal).
No Direito, materializa-se tal raciocínio de ciência feita do homem, voltada ao homem, nos limites de suas convicções – e porque não dizer: na sua ´boa ou má vontade´ de agir dessa ou daquela maneira.
Assim determinado, ao comparar o Direito com as ciências biológicas (medicina, odontologia, etc.) e as ciências exatas (matemática, física, etc.) as quais, além da racionalidade humana, dependem fortemente da natureza para definições dos seus rumos para o alcance de suas conclusões inteligíveis ao homem, observa-se claramente nestas ciências as fronteiras (limites) da ação e da vontade do homem.
Isto é, por maior que seja a boa vontade e esforço do homem, não se pode superar a morte, não se pode ignorar a força da gravidade, não se pode deixar de lado as conclusões matemáticas e químicas resultantes da contemplação do meio ambiente, etc.
Já ao Direito, determinações podem sim ser alteradas; conclusões estabelecidas como finais possuem caminhos de escape para, eventualmente, uma ´melhor´ solução; normas devem ser mutáveis em razão da sua necessária adaptação ao sempre indeterminado novo tempo e espaço e etc.
Dessa maneira, para justificar sua existência e necessidade, cabe ao Direito, como ciência nascida do homem como reflexo da vida do homem, buscar abrigo na crença (convicção) humana sobre a boa qualidade de vida que precisa nutrir e da constante persecução de desenvolvimento mais rápido e melhor durante sua existência – conforme padrões de eficácia, eficiência e efetividade.
O Direito, então, feito pelos homens, muitas vezes gaba-se de aparente independência das forças alheias à vontade humana, pois caracteriza-se por tentar adaptar tais forças naturais ao que se pretende, contrariamente àquelas ciências citadas, pois refletem as ações da natureza ao cotidiano humano, buscando adaptar o homem aos ditames naturais.
Qual então é a melhor forma de utilização do diferencial humano ‘racionalidade’ no mundo conhecido?
Tentar adaptar a natureza à racionalidade humana ou tentar adaptar a racionalidade humana à natureza?
Ou talvez exista alguma outra forma do homem perceber que o que se vive é o que se acredita, e o que se acredita pode transformar a natureza para uma vida melhor consigo e com os demais elementos bióticos e abióticos que o circunda?
Em outras palavras, a convicção desenvolvimentista deve ser voltada para o bem e para manutenção dos elementos mantenedores do meio onde se vive, para que esse próprio homem possa ter condições de continuar, racionalmente, arquitetando novos e melhores caminhos.
Alcança-se esse desiderato, inclusive, a partir de uma adequada gestão pública dos partícipes de um determinado Estado (ou até mesmo entre Estados), via regulação das atividades envolvidas, mediante critérios conformadores dessa boa prática estatal adiante indicados.
Desta forma, a partir desse raciocínio sugerido – do homem acreditar no sistema que criou para a viabilização do seu desenvolvimento quantitativo e qualitativo – propõe-se refletir sobre as afetações do Direito em relação à convicção desenvolvimentista do ser humano e do Estado que criou.
i) Direito e Convicção Jurídica
O Direito, em sua etapa final, é representado por normas jurídicas que determinam ou delimitam a atuação dos partícipes do Estado, por intermédio de regras, princípios e valores jurídicos que o conformam como sistema de regulação estatal.
Anteriormente ao universo jurídico, a regulação da atividade humana vem, primordialmente, da necessidade do homem de organizar o seu raciocínio como uma forma de auto interação para, então, conseguir interagir com o meio onde está inserido com o fito de viabilizar (ou satisfazer) a realização do seu básico instinto de desenvolvimento (vide Freud, Introdução ao narcisismo: ensaios de metapsicologia e outros textos (1914-1916), 2010).
Definir o que fazer, como fazer e quando fazer são atitudes indispensáveis para que homem, primeiro, compreenda-se em uma auto-regulação e, após, entenda o seu papel no meio ambiente e como o mundo externo ao seu universo subjetivo o afeta (para o estabelecimento de critérios racionais de regulação ambiental e social).
Isto é, a regulação de atividades intersubjetivas nasce, primordialmente, de uma auto-regulação subjetiva. Isto posto, um elemento básico de uma determinada convicção subjetiva de atividades viabilizadoras de desenvolvimento configura-se, justamente, no acreditar em seu resultado em potencial.
E essa crença, quando dividida e legitimada entre os cidadãos como elemento verdadeiramente viabilizador do desenvolvimento esperado, passa a ser protegida pelos sujeitos envolvidos desse compartilhamento de ideias e, assim, torna-se cogente para o grupo criado.
Basicamente, rotulou-se Direito essa obrigatoriedade de ter uma determinada convicção voltada a uma ideia comum a um dado grupo de pessoas em especifico momento e espaço. Tem como objetivo o desenvolvimento individual e intersubjetivo do cidadão e de todo o sistema estabelecido – na condição de conjunto de dicções cogentes e legitimas socialmente (normas), próprias de um Estado Democrático de Direito.
Não se ignora, outrossim, o fato de que essa convicção pode se realizar de forma social (por via religiosa, v.g.) e de maneira concatenada em normas também pré-estabelecidas e impostas a todos os integrantes de um grupo social.
Essa crença, então, no produto do processo de racionalização subjetiva, quando legitimada de maneira intersubjetiva, é o núcleo essencial do Direito. Em razão disto, a fé humana na ciência do Direito precisa ser bem operada pela regulação estatal, justamente para que a sua força se encontre na menor intensidade possível, considerando que o grau de convicção jurídica do homem-cidadão (pois agora inserido no Estado) e a necessidade de impressão de força do Direito possuem conexão direta.
Isto é, a relação entre a convicção no Direito e o desenvolvimento do cidadão e do Estado se resume no seguinte raciocínio: quanto mais os cidadãos acreditam, intersubjetivamente, no Direito, menos precisam da força do Direito para a promoção do seu desenvolvimento – pois, assim, a impressão da força será apenas sentida subjetivamente (individualmente) entre os cidadãos, sem a necessidade, desta maneira, da execução direta desta força entre os participes do Estado (intersubjetivamente).
Em outras palavras, saber que existe regulação de uma força imposta a todos, por meio de uma adequada gestão pública, convence e traz ao cidadão a sensação de que essa força não precisa estar presente em relações intersubjetivas já superadas por aquele que acredita na eficiência, eficácia e efetividade do Direito, conforme será exposto a seguir.
ii) Efetividade do Direito e desenvolvimento do cidadão
Definida a ideia abordada neste texto sobre convicção jurídica e sua influência no desenvolvimento intersubjetivo do cidadão, como finalidade última do Direito, procura-se, neste momento, conceder aplicabilidade concreta ao raciocínio anteriormente apresentado.
Cumpre-se tal tarefa, então, aplicando essas noções aos institutos da regulação e da gestão pública, conforme determinado sistema jurídico pré-estabelecido, mais propriamente a partir do regime jurídico administrativo definido no contemporâneo Estado nacional.
Sistema jurídico, ou Sistema do Direito, nada mais é do que a concatenação harmônica de valores, princípios e regras voltados para a finalidade de desenvolvimento intersubjetivo do homem, determinando os limites de suas ações para, propriamente, viabilizar outras tantas atividades legalmente limitadas que se interagem em um específico tempo e espaço.
Deste modo, tendo o Direito elementos que precisam ser organizados, delimitados e conduzidos para o alcance de um estabelecido desiderato, observa-se a necessidade de expressão de critérios objetivos voltados a sua adequada gestão. Para tanto, torna-se relevante esclarecer algumas noções sobre o papel do Estado na efetivação do Direito, como segue.
A partir do pressuposto da inafastável necessidade do homem de se desenvolver, objetivo este alcançado plenamente quando em estado (situação) de plena liberdade e paz, contudo, considerando que tais situações jamais serão atingidas em sua plenitude, verifica-se que a efetividade dos instrumentos viabilizadores de seu alcance é diretamente proporcional ao grau de desenvolvimento alcançado.
Portanto, dentro de uma disciplina da força (ação negativa delimitadora e disciplinadora) para a busca de liberdade e paz do homem, propiciadora do seu desenvolvimento, fulcra-se a crença da necessidade de eleição de um terceiro (independente à relação intersubjetiva estabelecida) legítimo monopolizador do uso da força garantidora do desenvolvimento almejado.
Como disposto, a busca incessante da paz e da liberdade, e sua necessária disciplina quando se contrapõe com outras liberdades, forma o Direito (como sistema) e o torna indispensável dentro de uma sociedade estruturada na forma que hoje se conhece.
Nesse prisma, observa-se o Direito não só como um contraponto limitador da atividade do homem, mas sim como um elemento promotor da organização e do alcance dos instrumentos de seu pleno desenvolvimento – como expressado, via a paz e a liberdade. De igual forma, atinge-se tal desiderato por intermédio de uma dura convicção que os elementos que conformam o Direito levarão o seu criador (o homem) a alcançar o esperado – e sempre renovado – desenvolvimento intersubjetivo.
Para Hegel (Princípios da filosofia do direito, 2003, p. 31), "o fato de uma existência em geral ser a existência da vontade livre constitui o Direito. O Direito é, pois, a liberdade em geral como ideia". O filósofo explica seu posicionamento ao lembrar que a definição Kantiana geralmente admitida, em que o elemento essencial é a limitação da liberdade própria do indivíduo (ou do seu livre-arbítrio) para que ela possa estar de acordo com o livre-arbítrio de cada um dos indivíduos segundo uma lei geral, apenas constitui uma determinação negativa (a de limitação). Por outro lado, explica o autor, o positivo que há nela, a Lei da razão universal ou como tal considerada, o acordo da vontade particular de cada um com a de cada outro, leva à bem conhecida identidade formal e ao princípio da contradição.
Ressalta Hegel que a citada definição contém a ideia muito divulgada desde Rousseau de que a base primitiva e substancial deve estar não na vontade como existente e racional em si e para si, não no espírito como espírito verdadeiro, mas na vontade como indivíduo particular, como vontade do indivíduo no livre-arbítrio que lhe é próprio.
É fato que o Direito é visto, muitas vezes, como a destinação e materialização do monopólio da imposição e execução da verdade pós-estabelecida para um terceiro eleito de forma legítima para utilizar a força – conforme um padrão de ponderação racional dos próprios elementos axiológicos de formação desse determinado Direito – ao favor (para o bem) dos mesmos cidadãos que o criaram. Entretanto, vale frisar os perigos que tal idéia traz consigo, quando vista apenas por um único ângulo, uma vez que, desta forma, justifica o uso da força para uma eventual tirania e desequilíbrio da balança do senso justo do bem.
Em outros termos, deve-se acrescer ao ponto de partida de monopolização do uso da força a razão para que tal fenômeno aconteça, qual seja: o desenvolvimento do homem. O homem, aqui, é o eixo de onde os demais valores do Direito giram – notadamente a família, a propriedade e as obrigações que delas decorrem entre os participantes de uma sociedade –, e, a partir dos valores que compreendem a promoção do homem, a força criada para disciplinar a força individual deve ser seguida, ao passo de acelerar a sua evolução como ser natural, de modo a assegurar os valores de dignidade interdependentes.
Segundo Hobbes, o homem não é sociável por natureza: ao contrário, ele é naturalmente egoísta e animado pela busca única de seu interesse individual, com menosprezo pelo interesse dos outros. Desta maneira, caso se considerasse o homem governado somente pela sua natureza, a condição coletiva seria um estado de guerra permanente entre os indivíduos providos de uma liberdade absoluta. O contrato interindividual só poderá ser motivado pela busca da segurança: a fim de escapar do estado de guerra e garantir a segurança, é preciso que cada indivíduo aceite renunciar à liberdade (vide BILLIER, Jean-Cassien, MARYIOLI, Aglaé. História da Filosofia do Direito, 2009).
Thomas Fleiner-Gerster (Teoria Geral do Estado, 2006), ao citar o estadista árabe Ibn Khaldûn, lembra que a necessidade de ter um rei superior para proteger a tribo foi, certamente, também em outras sociedades, a razão decisiva para a formação das primeiras comunidades com transmissão de poder político e central.
Ibn Khaldûn (The Muquaddimah, 1974) assim expressa: “Quando os homens alcançam uma determinada organização social, (...) necessitam de alguém que os controle, que abafe sua sanha de luta e proteja uns dos outros, pois a sanha de luta e a injustiça são inatas ao homem”. Para o autor árabe, não são os perigos externos, mas o estado de guerra interno que obriga os homens a formar comunidades estatais. Visto que ele, tal como posteriormente Hobbes, considera o homem um ser combatente, que busca conflito, este necessita, do seu ponto de vista, de uma liderança forte, a qual deve manter a ordem.
Assim determinado, firma-se o acordo semântico acerca da essencial inafastabilidade do uso da força legítima pelo Estado, quando questionado para tanto, formando o conceito de Jurisdição – qual seja: a presente noção de 'força' apresentada é aquela fundamental para coexistência e interdependência dos valores que fundamentam a existência digna do homem em sociedade para, ao fim, manter sua jornada inevitável de evolução natural.
Como tratado, a necessidade de ´regulação da atividade humana´ pelo Estado advém do pensamento de que a imposição unilateral da vontade, tendo como limite tão só a autonomia privada, sem parâmetros comuns – ou sociais – não proporcionava o desenvolvimento ideal de uma sociedade, ao contrário, causava prejuízos, estagnação, até mesmo retrocesso da evolução socioeconômica de um grupo de indivíduos.
Na ordenação do Estado muitas barreiras foram superadas para determinar que um terceiro precisava obter e viabilizar meios eficazes para ordenar a vida em comum.
Dirimiu-se, então, a visão de que o particular mais forte (física ou intelectualmente) deveria ter sua vontade prevalecida sobre aquele mais fraco – sem nenhum parâmetro de correção racional, desenvolvimento comum e manutenção da paz do grupo social.
De forma gradual, na história do desenvolvimento da organização do Estado hoje conhecido, a partir do momento em que os partícipes da sociedade perceberam que o exercício de sua liberdade de forma ilimitada não os conduzia ao progresso pessoal esperado, tal liberdade passou a ser parcialmente renunciada e concedida a um ente exterior, formando um pacto social – em que os membros de um determinado grupo possuíam objetivos de crescimento comuns e aqueles que assim não se adequassem, seriam punidos ou extirpados de tal convívio social.
Desse modo, após essa conjugação de 'liberdades parciais' ao terceiro criado – Estado – a necessária e legítima força, outrora faltante, forma-se para repelir os atos contrários aos limites impostos por esse terceiro.
Cabe, então, aos gestores do detentor desse poder a escolha dos meios e limites de utilização desse instrumento coercitivo legítimo para a 'melhor' evolução do Estado, que, agora, incorpora a função de tutor da sociedade, sendo, também, o seu dever a manutenção do grupo na paz almejada.
Ressalta-se, então, a partir desse ponto, o papel do cidadão na gestão pública, ou melhor dizendo, na gestão das liberdades concedidas ao Estado com a promessa de plena viabilização do bem comum, concretizado no desenvolvimento dos partícipes desse Estado, conforme um legítimo sistema jurídico estabelecido.
A chancela da sociedade é fundamental para a legitimação da atuação estatal e nasce da expressão de cada cidadão voltado a acreditar que tal Sistema do Direito estabelecido é o ideal para a viabilização do seu desenvolvimento individual (constante melhoria de sua qualidade de vida) e intersubjetivo.
Como observado, o homem não se sustenta em um universo social – nem suporta a si próprio – sem regras, sem padrões de comportamento mínimos que limitem sua liberdade. Logo, precisa acreditar em uma força que determine o que, onde, como e quando fazer.
Essa convicção (fé ou crença) é o elemento que o move para o alcance do desenvolvimento que persegue. E, levada ao padrão comum, entre os demais cidadãos, organizada em um sistema cogente de normas de conduta, consubstancia o que se chama Direito.
A partir da delimitação dessa convicção do cidadão no Direito, como meio ideal de viabilização do seu desenvolvimento, indica-se formas e instrumentos jurídicos que podem ser utilizados de maneira a incrementar este Sistema de normas voltado à proteção e promoção do cidadão. Então, neste estudo, sugere-se uma melhor compreensão e operacionalização da ‘regulação estatal’ e da ‘gestão pública’ – ambas aplicadas adequadamente concatenadas com os valores de dignidade do homem, como criador e decorrente receptor do integral empenho do Estado.
Destarte, recomenda-se a aplicação de determinados critérios jurídicos que tornam a regulação estatal um instrumento eficiente, eficaz e efetivo – a partir das noções jurídico-econômicas que conformam o pensamento aqui defendido de ´adequada gestão pública de políticas de Estado´ – claramente definida nas relações intersubjetivas dos cidadãos, para que estes passem a ter uma maior convicção no Direito posto.
Assim, consequentemente, a partir do natural desenvolvimento que tal fato gerará, esse mesmo cidadão precisará de uma menor impressão dessa força regulatória jurídica. E assim ocorrerá, pois as demais forças regulatórias (como a social) já desenvolvidas com o auxilio de todo esse aparato sugerido, alcançarão um amadurecimento ideal para que, deste modo, não precisem da coerção jurídica.
Ou seja, a pretensão aqui externada é de demonstrar como o Estado foi criado justamente para que o seu criador (homem) não precise de um Estado para determinar o que, como ou quando deve fazer ou não.
Isto é, demonstra-se que o Estado – e o Sistema Jurídico que o sustenta – simplesmente depende do grau de convicção no Direito que os cidadãos possuem, bem como, de como estes mesmos cidadãos se utilizam de instrumentos jurídicos oferecidos por esse Estado para proporcionar um sempre melhor desenvolvimento pessoal e intersubjetivo.
Em suma, se o Estado conseguir convencer o cidadão de que a força impressa pelo seu Sistema do Direito é eficiente, eficaz e efetiva – com auxilio da regulação estatal e da adequada gestão pública – esse mesmo cidadão passará a autorregular suas atividades, pois terá a saberá estabelecer as consequências positivas de sua atuação, em conformidade com esse mesmo Sistema – sem precisar, assim, da impressão de forças externas.
Ao contrário, se esse mesmo cidadão pouco acreditar no Sistema de Direito estabelecido, certamente precisará da impressão concreta da força regulatória desse Sistema, para assim se adequar aos padrões determinados como apropriados a todos os participes desse Estado.
Pretende-se, então, dizer que a boa regulação estatal e a adequada gestão pública são instrumentos interessantes para a realização de um Sistema de Direito ideal, qual seja: aquele que viabilize o constante desenvolvimento do cidadão ao ponto que alcance a talvez utópica situação de convivência intersubjetiva suficiente para uma regulação social desprendida da muleta estatal.
Assim, imagina-se que a história de criação e consolidação do Estado está fadada à destruição quando alcançar o seu sucesso primordial.
Nesse sentido, quando a convicção jurídica do cidadão chegar ao ponto de que não se precise mais de um Sistema Jurídico, esse cidadão estará apto a voltar a ser o homem digno que se almeja no núcleo primordial dos valores fundamentais da pessoa humana.
Entretanto, o homem precisa garantir o seu desenvolvimento e, ao que parece, ainda não confia em si para essa tarefa. Outrossim, não se vislumbra interesse do Estado estabelecido em promover ações que levem à dispensa de sua existência.
Isto é, quanto mais esclarecido é o cidadão sobre os seus direitos e deveres estatais e como essa postura demanda uma menor atuação do Estado, mais percebe que pode ser independente desse mesmo Estado que criou.
Fato que, por si, parece tirar o chão (regra geral) dos cidadãos, pois aparentam pensar que não há nada melhor do que a conveniência do auto-engano de ter sua liberdade orientada pelo outro (vide “Auto-Engano”, de Eduardo Gianetti).
Situação que, sublinha-se, atrapalha o desenvolvimento e lhes trazem a agonia de viver – pois se sentem confortáveis em estar dependentes sem maiores tarefas. Entretanto, por outro lado, ainda possuem a necessidade de atender ao instinto de se desenvolver de forma mais rápida e melhor, o que demanda, principalmente, (auto) superação de desafios como esses apresentados. Logo, fica evidente a eterna batalha do “posso fazer melhor” contra “façam o melhor por mim”.
De todo o narrado, tem-se que o Estado permanecerá se apresentando como útil aos interesses do homem que, por sua vez, continuará gerando novas demandas para justificar a existência desse Estado que o ajuda no atendimento do seu básico instinto desenvolvimentista.
Logo, acreditar em um futuro melhor sempre encontrará o infinito horizonte de novos problemas que por si, na condição de homem apenas, não serão resolvidos. Resta, então, colocar as vestes de cidadão e alimentar a fornalha estatal para a manutenção do apoio que a racionalidade humana ainda não aprendeu a se soltar.
Ou melhor, resta assumir que o homem ainda não compreendeu que mais importante que cumprir com as determinações externas impostas por um Estado, é efetivar a regulação de si próprio para ficar bem consigo, com o próximo e, desta simples maneira, ajudar no desenvolvimento de todo o sistema estatal para, um dia, deixar de precisar dele.
– Basta, para tanto, não desviar do caminho.