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Migração para a Previdência Complementar na Bahia é feita sem indenização do servidor

ANO 2022 NUM 484
Paulo Modesto (BA)
Professor de Direito Administrativo da UFBA. Presidente do Instituto Brasileiro de Direito Público. Doutorando em Direito Público pela Universidade de Coimbra. Membro da Academia de Letras Jurídicas da Bahia e do Ministério Público da Bahia. Diretor-Geral da Revista Brasileira de Direito Público. Editor do site direitodoestado.com.br


10/06/2022 15:12:42 | 2041 pessoas já leram esta coluna. | 2 usuário(s) ON-line nesta página

Desde a Emenda Constitucional 103, de 2019, Estados e Municípios devem disciplinar com autonomia diversos aspectos da previdência dos seus servidores públicos.  Antes de 2019 a maior parte das regras da previdência local reproduzia simplesmente normas de vigência nacional.  A essa autonomia ampliada deve corresponder um maior cuidado na disciplina local de temas previdenciários e maior transparência no debate público.  

Questões sensíveis podem passar muitas vezes abaixo do radar da opinião pública. O Estado da Bahia, por exemplo, vive um momento particularmente importante: dia 28 de julho encerra o prazo para a migração dos antigos servidores para a Previdência Complementar estadual e ainda há indefinições na matéria. 

Esse prazo vale para os servidores efetivos que tomaram posse no Estado antes de 29/07/2016, data em que o Regime de Previdência Complementar começou a vigorar na Bahia (depois de aprovado o plano de benefícios pela Previc), e que ganham acima do teto do INSS (hoje R$7.087,22). A PreviBahia, atualmente Previnordeste, foi autorizada pela Lei 13.222/2015. 

Ao contrário do que ocorreu em nove outros Estados (Piauí, Ceará, Pará, Rio Grande do Sul, Alagoas, Minas Gerais, Paraná, Maranhão e Santa Catarina), além da União, o Estado da Bahia fixou prazo para migração dos antigos servidores à Previdência Complementar estadual e não disciplinou ainda a forma de compensação das contribuições feitas a maior por esses agentes durante o período em que contribuíram em patamar superior ao teto do INSS (RGPS). Essa compensação recebe o nome de Benefício Especial. 

A migração de regime é opcional e apresenta feições típicas de acordo administrativo de adesão, do qual se extraem obrigações e direitos predefinidos, à semelhança dos planos de desligamento voluntário, embora não importe em ruptura do vínculo com o Estado. No caso do benefício especial, o acordo é parametrizado por fórmula de compensação legal vinculada à carreira contributiva do servidor na relação previdenciária.

O servidor aquiesce com a redução do valor máximo para a sua aposentadoria em contrapartida ao pagamento compensatório pela Administração da diferença da contribuição vertida pelo servidor antes da migração. Feita a opção, a aposentadoria e a pensão no regime próprio ficarão limitadas a R$ 7.087,22 (valores atuais do teto do INSS). Essa opção vincula o servidor a novo regime de contribuição e constitui ato jurídico perfeito, irretratável. 

Não há fórmula padrão de compensação, do mesmo modo que não há figurino ideal ou padrão nos programas de desligamento incentivado ou aposentadoria incentivada.  Sequer há formato único para o benefício especial no tempo. Como regra, o benefício especial é pago após a inatividade, em paralelo à aposentadoria, a revelar o seu caráter não remuneratório, pois não constitui contraprestação de atividade laborativa. 

Não é tampouco hipótese de repetição tributária comum, pois a devolução do excedente das contribuições vertidas não está restrita aos últimos cinco anos nem tem em regra prazo definido de liquidação.  É compensação ou ressarcimento, de pagamento fracionado no tempo, resultante de acordo indenizatório prefixado em lei a que adere o servidor optante. 

Para o Estado, a migração dos antigos servidores para o novo regime de custeio amplia a previsibilidade de desembolso financeiro futuro e promove a redução das taxas de juros cobradas para obtenção de empréstimos e financiamentos pelo Poder Público; reduz a litigiosidade sobre a garantia da paridade; desincentiva movimentos paredistas e promove a redução da complexidade regulatória em matéria previdenciária.

Para o servidor, a migração pode fortalecer a segurança jurídica e previdenciária futura, e constitui decisão personalíssima, que envolve planejamento de vida e não apenas planejamento previdenciário. 

Na Bahia, o fim do prazo ocorre sem que o tema sensível do benefício especial seja disciplinado; o servidor é convidado a migrar às cegas, ou sem compensação, com segurança previdenciária menor do que existe hoje em nove outros Estados da Federação. Espera-se que esse prazo fatal seja estendido até que venha a disciplina estadual do benefício especial, pois somente assim a opção dos agentes estaduais será realizada de modo justo e informado.


PS.  Este texto é a versão completa do artigo publicado hoje, 10/06/2022, em formato resumido no Jornal A Tarde, página A2, sob o título "Previdência na Bahia: decisão às cegas". 
PS2. Sobre o tema do benefício especial, consulte também, do autor (link ativo): Ingratidão previdenciária e benefício especial e Benefício especial: migrar ou ser migrado?

 



Por Paulo Modesto (BA)

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