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Inaplicabilidade da Lei 13.019/13.204 a Organizações Sociais Qualificadas nos Estados, Distrito Federal e Municípios

ANO 2016 NUM 217
Paulo Modesto (BA)
Professor de Direito Administrativo da UFBA. Presidente do Instituto Brasileiro de Direito Público. Doutorando em Direito Público pela Universidade de Coimbra. Membro da Academia de Letras Jurídicas da Bahia e do Ministério Público da Bahia. Diretor-Geral da Revista Brasileira de Direito Público. Editor do site direitodoestado.com.br


21/07/2016 | 5439 pessoas já leram esta coluna. | 3 usuário(s) ON-line nesta página

Segundo o Art. 3º, III, da Lei 13.019/2004, diploma amplamente reformulado pela Lei 13.204/2015, as suas normas não são aplicáveis “aos contratos de gestão celebrados com organizações sociais, desde que cumpridos os requisitos previstos na Lei nº 9.637, de 15 de maio de 1998" (Redação dada pela Lei nº 13.204, de 14 de dezembro de 2015).

A Lei nº 9.637, de 15 de maio de 1998, é a lei federal das Organizações Sociais e a Lei 13.019/2014 apresenta-se como lei nacional de normas gerais das relações de parceria social (Art. 2º, II). Esse aparente paradoxo não deve sugerir que as organizações sociais qualificadas nos Estados, no Distrito Federal e nos Municípios passaram a ter o funcionamento e a prestação de contas disciplinada pelas Leis 13.019/2014 e Lei n. 13.204/2005.

Existem no mínimo duas razões para essa compreensão.

Primeiro, consoante o Art. 15 da Lei n. 9.637/1998, relevante para o tema proposto, as leis estaduais e municipais que não contrariarem os preceitos da lei federal e a legislação específica de âmbito federal podem receber a extensão dos efeitos da legislação federal tanto da declaração de utilidade pública (atualmente extinta) quanto das normas regentes da destinação de recursos orçamentários e bens públicos necessários ao contrato de gestão. É dizer: a Lei Federal assegurou o mesmo tratamento concedido ao regime jurídico regente das entidades qualificadas no âmbito federal às entidades qualificadas em estados, distrito federal e municípios, desde que os princípios da norma federal fossem respeitados na legislação local, sem adulteração do modelo. Essa mesma diretriz funcional expansiva ou extensiva deve guiar a compreensão do disposto no Art. 3º, III, da Lei 13.019/2004, com a redação da Lei 13.204/2015, de forma que “cumprir os requisitos previstos na Lei 9.637, de 15 de maio de 1998”, deve ser compreendido como o cumprimento de legislação local compatível com os princípios e as exigências constantes da Legislação Federal das Organizações Sociais.

Seria evidente contradição a Lei 13.019 definir-se como lei nacional de normas básicas de parcerias e ser aplicada unicamente a organizações sociais estaduais, distritais e municipais, sobretudo quando a legislação local mimetizar em grande parte a legislação federal das organizações sociais. A equivalência entre exigências básicas estabelecidas por leis de organizações sociais no âmbito da federação deve servir para aplicação das mesmas normas básicas nacionais, excludentes ou includentes de dado regime jurídico nacional especial, preservando o caráter uniforme do critério adotado.

Segundo, diversas normas da Lei 13. 019/2014, com a redação da Lei 13.204/2015, estabelecem exigências incompatíveis com o modelo das organizações sociais, ao menos como adotado na União e na grande maioria das unidades subnacionais. Esta decisão, por si, não significa muita coisa: é apenas a decisão de diferenciar o regime geral e regimes especiais de parceria público social (Paulo MODESTO, Parcerias Público Sociais - PPS: categoria jurídica, sustentabilidade e controle em questões práticas, no prelo, págs. 34-35). Basta referir a proibição, constante do inciso III do Art. 39  da Lei 13.019/2014, com redação dada pela Lei 13.204/2015, segundo a qual “ficará impedida de celebrar qualquer modalidade de parceria prevista nesta Lei a organização da sociedade civil que: (...) III - tenha como dirigente membro de Poder ou do Ministério Público, ou dirigente de órgão ou entidade da administração pública da mesma esfera governamental na qual será celebrado o termo de colaboração ou de fomento, estendendo-se a vedação aos respectivos cônjuges ou companheiros, bem como parentes em linha reta, colateral ou por afinidade, até o segundo grau”. Como se sabe, na legislação federal e em parte da legislação subnacional, agentes públicos são designados para compor o Conselho de Administração de organizações sociais qualificadas, especialmente quando estas celebrem contratos de gestão com o Poder Público, veículo de parceria típica. É previsto no Art. 45 da Lei 13.019/2014, com a redação da Lei n. 13.204/2015, a proibição de o vínculo de parceria “pagar, a qualquer título, servidor ou empregado público com recursos vinculados à parceria, salvo nas hipóteses previstas em lei específica e na lei de diretrizes orçamentárias”. Não está claro o alcance da expressão lei específica neste dispositivo, nem interessa aqui neste momento explorar, pois o pagamento de servidores públicos cedidos a organizações sociais é previsto expressamente no Art. 14, §2º, quando em causa pagamento de adicional relativo ao exercício de função temporária de direção e assessoria no âmbito da entidade fomentada por agente público cedido.

Essas breves considerações sobre o tema em epígrafe mostram o equívoco da interpretação literal ou pedestre da Lei 13.019/2014, com a redação dada pela Lei 13.204/2015, cuja compreensão redutora somente é plausível para os que, ao invés de mirarem a floresta, miram uma pequena árvore destacada de seu conjunto e não a compreendem.



Por Paulo Modesto (BA)

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