Márcio Monteiro Reis (RJ)
Democracia em crise
A crise da democracia tem sido observada em todo mundo. Há um desconforto mais ou menos generalizado com o exercício dos poderes estatais e o modo como se organizam e agem, que eclodiu e se tornou mais evidente a partir de 2010, com o surgimento do movimento no Oriente Médio que ficou conhecido como Primavera Árabe, seguido de ecos sucessivos, como o Occupy Wall Street nos EUA, em 2011, os protestos de 2013 no Brasil, mais recentemente, em 2018, os Gilets Jaunes na França e tantos outros movimentos espontâneos de contestação ao status quo e a governos dos mais variados matizes políticos.
Atualmente já é bastante bem conhecido esse movimento histórico impulsionado por um desencanto generalizado e um descontentamento das pessoas ao redor do mundo pela forma como são governadas. As transformações da Era Digital, com a revolução provocada na forma de comunicação entre as pessoas, aceleraram expressivamente o movimento de globalização e criaram formas de divulgação de ideias, informações e notícias e também de organização de movimentos sociais, nunca antes vista. Mas o movimento que surgiu em países árabes, dando a impressão de que se tratava da força da democracia se impondo sobre regimes autoritários, os quais não conseguiam mais controlar suas populações em decorrência da força libertária das redes sociais, logo se espalhou por países de longa tradição democrática, expondo as feridas abertas da própria democracia. Os mecanismos de livre expressão de ideias e opiniões proporcionados pela internet e pelas redes sociais passaram a causar preocupação também pela sua capacidade de desinformação, com o agigantamento das fake news e das radicalizações políticas (vide REIS, 2018), afetando especialmente os processos eleitorais e representando uma grave ameaça a esse relevantíssimo mecanismo do funcionamento democrático.
Já há, em nossos dias, um relativo consenso quanto à latência de uma força transformadora a incidir sobre a democracia. Pouco ou nada se sabe por enquanto, contudo, sobre o que resultará desse impacto transformador, nem quanto tempo essa força histórica levará para completar o seu ciclo. Creio que não há nada a indicar que a democracia esteja cedendo espaço para algum outro tipo de regime político. Ao contrário, as forças motrizes do movimento que se observa são catalisadas por uma ânsia de maior participação popular. O modelo atual de democracia indireta representativa tem se mostrado desgastado e incapaz de dar respostas adequadas a uma população que não se sente representada e se revolta com governos com os quais não se identifica. Parece impossível, nesse momento, entender no que tudo isso resultará e quais serão as transformações políticas ou eleitorais que poderão ocorrer. Não há clareza sequer para os próprios manifestantes espalhados pelo mundo, cujas reivindicações, em geral, são vagas e imprecisas, por vezes até desconexas. Ainda não surgiu uma pauta clara, nem nenhum movimento intelectual que fosse capaz de canalizar essa força e formular proposições que pudessem direcionar a sua energia. Mas o núcleo de onde se originam essas reações propulsoras de transformação histórica parece apontar na direção de algum tipo de reforma dos mecanismos democráticos, que venha a reforçar os meios de participação popular nas decisões tomadas na esfera pública e não o contrário.
Isso não significa, no entanto, que a democracia não esteja em risco. Ainda que a resultante, em um futuro incerto, seja inexoravelmente uma expansão democrática, o processo pode provocar aqui e ali retrocessos e resultados indesejados, causados pelo descontrole das próprias forças transformadoras. No Brasil, ainda somos uma democracia em amadurecimento, que busca fortalecer suas instituições quando, pela primeira vez, na história republicana, completamos mais de quatro décadas de um regime político contínuo, sem rupturas. Devemos ter especial cuidado nesse momento tão delicado pelo qual todo o mundo está passando. Um passo em falso pode nos afundar em um precipício de equívocos, adiando sabe-se lá por mais quantas décadas a ascensão desse país à posição de liderança econômica e política no cenário internacional, que o tamanho do seu território e suas riquezas impõe, momento tão adiado pelos erros que insistimos em cometer.
Nos últimos dias, temos assistido a um grande esgarçamento de nossas instituições, com declarações — algumas em tom ameaçador — partindo do Presidente da República e de outras autoridades do Poder Executivo, repudiando decisões tomadas pelos outros Poderes, alegando o cerceamento dos seus próprios e se apresentando como vítima de ações conspiratórias. Certamente, esse ambiente belicoso não contribui para a estabilidade política desejável e tão relevante no momento em que o mundo inteiro enfrenta uma pandemia, às portas de uma crise econômica de consequências ainda imprevisíveis. Trataremos desse esgarçamento institucional em seguida. Por ora, cabem algumas breves considerações sobre o princípio da separação de poderes e as tensões que se lhe são inerentes.
Separação de poderes
A ideia de dividir os poderes decorrentes da soberania estatal entre autoridades e instituições diversas, de modo que o seu exercício não se dê de forma autoritária e arbitrária, forçando os depositários do poder do Estado a buscarem algum nível de harmonia e cooperação e criando mecanismos recíprocos de controle foi uma conquista das revoluções burguesas e coincide com a reincorporação de um regime político que havia sido concebido milênios antes pelos gregos que, bastante modificado, voltava a se apresentar: a democracia.
O ocaso da Idade Média e do seu fragmentado sistema político de feudos havia se dado com a reunificação dos Estados nacionais. Os reis, financiados pela própria burguesia, haviam se tornado extremamente poderosos, razão pela qual conseguiram cumprir a missão de reorganização dos Estados, afirmando a sua soberania. A figura desses reis se confundia com a dos próprios Estados que governavam, a ponto de eles mesmos serem chamados de Soberanos. O Absolutismo foi a Era dos reis tiranos e de poderes ilimitados. O movimento histórico seguinte, também liderado pela burguesia, visava angariar para si, ao menos parte do poder político que sua riqueza havia proporcionado à monarquia.
Na Inglaterra, o absolutismo não tomou as mesmas proporções que em outras partes da Europa, como a França de Luiz XIV. A burguesia conseguiu manter uma tensão política que restringia, de algum modo, os poderes reais. Embora não fossem permanentes, os parlamentos se constituíam exatamente naqueles momentos em que o rei se ressentia de apoio político e servia como um ambiente institucional de negociações. Quando se percebia mais fortalecido, o dissolvia e podia governar com mais liberdade, até que reconhecesse o seu poder novamente ameaçado e precisasse convocar um novo parlamento. As Cartas reais também desempenhavam importante papel limitador de seu poder. Embora se tratasse de autolimitação, essas cartas evidentemente advinham da pressão exercida sobre os reis. Essa aparente liberalidade autolimitativa se apresentava, na verdade, como forma de arrefecer algum arroubo transformador do ambiente político. A Constituição de Claredon, confirmada em 1154 por Henrique II, entre outras providências, limitava o poder real de tributar. É um dos primeiros documentos dessa espécie, sendo a Magna Carta, de 1215, a mais famosa, por meio da qual João Sem Terra, muito enfraquecido, reduziu substancialmente os seus poderes, tendo sido o texto definitivo estabelecido por seu filho Henrique III, em 1217 (PLUCKNETT , 2010, pp. 20 a 34).
Outras tantas se seguiram. Mas a ideia relevante é a constatação de que mesmo o Poder Absolutista na Inglaterra se mantinha sob uma tensão política, que lhe impunha algumas limitações e que o equilíbrio era encontrado no funcionamento de algumas instituições que apareceram naquela época e que cumpriam um importante papel de estabilização: especialmente os parlamentos e as cartas reais. Quando, no século XVII, os reis da ascendente dinastia Stuart pretenderam restaurar os poderes absolutos da monarquia, resgatando a ideia de que o rei só se submete à vontade de Deus e nunca à dos homens (“The King is subject not to men, but to God and the law”, PLUCKNETT , 2010, p. 49), precipitaram-se os movimentos revolucionários que levaram à guerra civil na Inglaterra, em que o exército do Parlamento se contrapôs ao exército real, levando à queda da monarquia e à implantação da República de Crownwell. Após a restauração, com a volta dos Stuarts ao trono, o enfrentamento foi retomado, até que Guilherme III, Príncipe de Orange, invadisse a Inglaterra, com o apoio do Parlamento e assumisse o trono, sob a condição de lhe jurar lealdade e acatar o Bill of Rights recentemente aprovado, inaugurando o que ficou conhecido como a monarquia constitucional inglesa.
O grande teórico desse movimento foi John Locke, que no seu “Dois Tratados sobre o Governo” conseguiu propor uma nova estrutura institucional para o Estado Constitucional que surgia, concebendo a separação dos poderes estatais dentre autoridades diversas como um necessário mecanismo por meio do qual pudessem impor-se mutuamente limites, de modo a controlarem-se umas às outras quanto ao seu exercício. Locke não apresenta uma ideia fechada de organização do Estado. A ideia principal é a de que os poderes políticos da comunidade (ou do Estado) não podem ser todos atribuídos a um único indivíduo, mas devem ser dispersos. O Poder supremo, segundo sua concepção, que marcou profundamente a cultura e a tradição política inglesa até os nossos dias, é o Legislativo (LOCKE, 1689, sec. 134), único capaz de restringir as liberdades individuais e interferir na propriedade dos cidadãos pela instituição de tributos, razão pela qual não deve ser exercido individualmente, mas sim por uma assembleia, cujos membros deveriam ser representantes do povo. Segundo Locke, qualquer governo deveria ser sempre subordinado à vontade popular, se submeter às leis e responder ao Parlamento, — do qual é um dos membros, no regime parlamentarista inglês —, podendo ser substituído por outro de seus membros assim que deixar de contar com a confiança do colegiado (LOCKE, 1689, sec. 152). Por outro lado, o chefe do governo tem a prerrogativa de dissolver o parlamento, o que não o torna em nada superior àquele, já que a decisão quanto à dissolução — que lhe é atribuída em confiança de que seu exercício ocorrerá apenas quando interpretar ser essa a vontade do povo — importará em novo escrutínio para a escolha de outros representantes, com sua legitimidade renovada (LOCKE, 1689, sec. 156).
Na França, o Absolutismo atingiu níveis bastante mais radicais do que na Inglaterra, tendo se tornado célebre a afirmação de Luiz XIV, conhecido como Rei Sol, de que ele próprio era o Estado. A ruptura, então, também chegou de maneira violenta, com a condenação de seu trineto, Luiz XVI, à morte na guilhotina em meio à longa e sangrenta guerra civil que caracterizou a Revolução Francesa. Apesar de ter ocorrido cerca de um século mais tarde e em um contexto bastante distinto, a Revolução Francesa fundou-se em ideais semelhantes aos da Revolução Inglesa e também afirmou a submissão do Estado às leis e a necessidade de separação dos poderes estatais, tendo Rousseau, Montesquieu e outros teóricos franceses que canalizaram o espírito revolucionário, encontrado nítida inspiração na obra de John Locke.
Na França, no entanto, a elevação do Judiciário — que era um mero braço do rei para o exercício delegado de funções jurisdicionais — a um poder independente, levou a uma relação conflituosa com as forças revolucionárias, já que a maioria dos juízes e tribunais, oriundos do Antigo Regime, haviam logrado manter suas posições, passando ilesos aos devastadores influxos revolucionários. Os embates que se deram, então, levaram os revolucionários a emplacar uma curiosa leitura do princípio da separação de poderes, segundo a qual o Poder Judiciário não poderia julgar a Administração, pois isso significaria invadir suas competências. Assim, já em 1790 foi aprovada a lei de 24 de agosto, com o seguinte teor: “Os juízes não podem intervir de modo algum nas operações dos corpos administrativos”, o que foi confirmado pela lei de 16 fructidor III (3 de setembro de 1795), que assim versava: “É proibido aos tribunais conhecer os atos da administração”. Instituiu-se na França, então, o contencioso administrativo, que acabou levando à constituição do Conselho de Estado no topo de uma jurisdição administrativa, inteiramente independente da jurisdição civil, o que está na origem do direito administrativo, um ramo do direito aplicável apenas às relações jurídicas de que participe o Estado.
A existência de uma jurisdição interna no Poder Executivo não subtraiu, no entanto, a independência dos juízes administrativos, nem enfraqueceu a ideia de separação de poderes, justificada por Montesquieu na necessidade de assegurar que o poder deve limitar o poder, como única forma de evitar abusos (“Pour qu'on ne puisse abuser du pouvoir, il faut que, par la disposition des choses, le pouvoir arrête de pouvoir”, MONTESQUIEU, 2011, pos. 2885), conceito ao qual a tradição jurídico‑política francesa sempre se manteve fiel. Também estava presente na obra de Montesquieu a ideia de soberania do povo (MONTESQUIEU, 2011, pos. 225) e a necessidade de assegurar a sua representatividade para o exercício dos poderes estatais, podendo-se identificar, já naquela época, a ideia de adoção do sufrágio universal, que só viria a se tornar realidade durante o século XX (MONTESQUIEU, 2011, pos. 2971). Há preocupação marcante em seus escritos com a necessidade de assegurar mecanismos institucionais que permitam um controle recíproco entre os poderes, formando o famoso sistema de freios e contrapesos (checks and balances) de que se veio a falar mais tarde. Tais mecanismos consistiriam essencialmente em atribuir aos poderes o que chamava de faculdades de “statuer”, que consistia no poder de deliberar diretamente ou de ou alterar, corrigir, o que foi deliberado por outro poder; ou, em outros casos, de “empêcher”, quando lhe seria transmitida a prerrogativa de se opor, de obstar, vetar ou anular a decisão do outro (MONTESQUIEU, 2011, pos. 2995).
Como se vê, é inerente à separação dos poderes a introdução de mecanismos de tensionamento institucional, intervenções e controles recíprocos. Ao tempo em que se atribui determinadas competências a um dos Poderes, se atribui aos demais contra‑poderes, que permitem, em alguns casos, desautorizar certas decisões ou modificá-las. A desejada harmonia entre os poderes, portanto, é construída por meio de embates ou autocontenções para evitar atritos indesejados. É pelo receio de ser desautorizado por outro poder que se evita o arbítrio. A frustração de ver suas decisões derrubadas, como se vê, faz parte do jogo democrático. O temperamento no exercício das próprias competências e a busca de entendimento com os demais Poderes é a consequência direta dessas tensões institucionais sempre presentes, que resultarão em maior harmonia na medida da sabedoria, capacidade de diálogo e articulação daqueles que exercem os poderes estatais.
Esgarçamento institucional
Um grande perigo se apresenta quando essa tensão supera os níveis saudáveis e se aproxima de um embate irreversível em que um dos Poderes passa a ameaçar a existência dos demais, comprometendo irremediavelmente a harmonia e independência entre eles, de que cuida o artigo 2º da Constituição brasileira. As instituições devem ser dotadas de certa maleabilidade e flexibilidade, a fim de se adaptarem a circunstâncias e intercorrências diversas, mas toda elasticidade tem os seus limites, a partir de quando a estrutura pode se deformar irremediavelmente ou até romper.
No Brasil, temos visto uma escalada perigosa dessa tensão e do esgarçamento a que estão sendo submetidas as nossas instituições. Em parte, esse movimento se iniciou ainda durante as últimas eleições presidenciais em que se via, dentre os apoiadores da força política que elegeu o Presidente da República, manifestantes clamando pelo fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal e por intervenção militar no governo. Nas últimas semanas e meses, no entanto, o quadro tem se tornado mais grave em razão de manifestações expressadas diretamente pelo Presidente e outras autoridades do Poder Executivo.
Em meados de abril, em meio a críticas contundentes quanto à sua postura no enfrentamento da pandemia que tem atingido severamente o Brasil e logo depois de ter demitido o seu Ministro da Saúde, o Presidente da República desferiu ataques contundentes ao Presidente da Câmara dos Deputados. Muito além do embate político, o Presidente da República afirmou, por ocasião da aprovação de um projeto de lei complementar que definia auxílios a serem prestados pelo governo federal a estados e municípios no combate à Covid 19, que o Presidente da Câmara “resolveu assumir o papel do Executivo”, acusou-o de conspiração e complementou dizendo: “Parece que a intenção é me tirar do governo” (CNN, 16/04/20 e InfoMoney, 16/04/20). Veja-se que, nesse caso, tratava-se da aprovação de uma lei, função típica do Poder Legislativo. É claro que se trata de assunto de interesse do Poder Executivo, a quem coube a formulação original da proposta. Mas, nesse caso, a Constituição atribui ao Parlamento o poder da decisão final. Trata-se do que Montesquieu chamava da função de “statuer”, ou de deliberar a respeito de assunto de interesse de outro poder. Cabe ao Poder Executivo buscar as articulações e convencimentos necessários junto ao Parlamento, pois a decisão, embora impacte em sua atuação, não é sua. Não há como pretender acusar de conspiração quem age nos limites da Constituição e toma decisões que lhe cabem, mesmo que desagradem ao outro poder.
No final de semana seguinte, o Presidente da República participou pessoalmente de manifestações populares — que violaram as regras de proibição de aglomerações devido à pandemia — nas quais havia referências ao fechamento de outros poderes e intervenção militar (Folha, 20/04/20). O mal-estar provocado levou o Ministro da Defesa a divulgar nota oficial afirmando que “as Forças Armadas trabalham com o propósito de manter a paz e a estabilidade do País, sempre obedientes à Constituição Federal” (DEFESA, 20/04/2020).
Com nova semana decorrida, o país foi sacodido com a demissão do Ministro da Justiça, anunciada pelo próprio em pronunciamento oficial enquanto ainda ocupava o cargo, seguida por decisão adotada pelo Supremo Tribunal Federal de suspender a nomeação do novo Diretor-Geral da Polícia Federal, por suspeita de desvio de poder embasada na denúncia formulada pelo ex-Ministro de que havia pretensão presidencial de patrocinar intervenção política naquela instituição (STF, MS 37097). O Presidente da República expressou grande irresignação com tal decisão judicial e declarou que sua prolação havia “quase” provocado uma crise institucional. “Faltou pouco”, afirmou. Disse, ainda, que não havia “engolido” a decisão e conclamou que “todos respeitem a Constituição” (AgênciaBrasil, 30/04/2020). O episódio se tornou ainda mais grave em razão de noticiada reunião sua com a cúpula das Forças Armadas (O Globo, 03/05/20), em que a decisão do Supremo teria sido duramente criticada, levando o Presidente da República, durante nova participação em manifestação popular onde se via apoio a atos anti-democráticos, a dizer que havia chegado “no limite” e, em tom ameaçador asseverar que pedia a Deus “que não tenhamos problemas nessa semana”, pois “daqui para a frente não tem mais conversa, daqui para frente, não só exigiremos, faremos cumprir a Constituição, ela será cumprida a qualquer preço”. Isso tudo permeado pela afirmação de que as Forças Armadas estavam ao seu lado (Estadão, 03/05/20 e Correio Braziliense, 03/05/20).
No dia seguinte, o Vice-Presidente Hamilton Mourão, em entrevista à rádio Gaúcha, referindo-se à suspensão da nomeação do Diretor-Geral da PF e a outro episódio, em que a decisão presidencial de expulsar diplomatas venezuelanos também havia sido suspensa pela Justiça, declarou que havia uma disputa de poder e “que cada um tem que navegar dentro dos limites da sua responsabilidade” e prossegiu: “Então os casos mais recentes aí, que foi a nomeação do diretor-geral da Polícia Federal, a questão dos diplomatas venezuelanos, são decisões que são do presidente da República. É responsabilidade dele e decisão dele escolher seus auxiliares, assim como chefe de Estado ele é o responsável pela política externa do país. Então, acho que os poderes têm de buscar se harmonizar mais e buscar entender o limite da responsabilidade de cada um” (GaúchaZH, 04/05/20 e O Globo, 04/05/20).
Embora seja possível discutir o mérito de ambas as decisões e discordar de seu acerto jurídico, fato é que, mais uma vez, o Supremo Tribunal Federal exerceu uma atribuição típica sua: atuou no exercício do controle de legalidade e legitimidade dos atos praticados pelo Presidente da República. Como se sabe, qualquer ato administrativo, praticado por qualquer autoridade, ainda que dentro dos limites de suas competências, estará sempre sujeito ao controle pelo Poder Judiciário. Tratando-se de atos do Presidente da República esse controle é realizado pelo Supremo Tribunal Federal, a quem também cabe, por exemplo, afastar o cumprimento de leis que julgue inconstitucionais, sem que isso jamais tenha sido visto como disputa de poder, interferência indevida ou afronta aos poderes do Presidente da República ou do Congresso Nacional.
Não faz, portanto, nenhum sentido questionar a decisão judicial sob o enfoque de que se tratava de matéria da competência do Poder Executivo. Trata-se aqui do que Montesquieu chamava da prerrogativa de “empêcher”, ou seja, de se opor, de obstar, vetar ou anular a decisão de outro poder, frequentemente exercida pelo Poder Judiciário. Especificamente em relação à suspensão do ato de nomeação para cargo em confiança, deve-se recordar que, alguns anos antes, sob os aplausos do atual Presidente da República e demais integrantes de seu grupo político, o Supremo Tribunal Federal havia obstado o ato da Presidente Dilma de nomeação do ex-Presidente Lula para o cargo de Ministro (STF, MS 34070), o que revela à toda evidência que o inconformismo, agora, não se relaciona com os limites da intervenção de um Poder sobre o outro, mas sim com o conteúdo da decisão, que desagradou ao Presidente. Deve-se considerar, no entanto, que qualquer mecanismo de controle tem sempre o potencial de frustrar determinadas investidas e limitar o exercício dos poderes exercidos por certas autoridades, o que quase sempre causará algum desagrado.
A decisão do Supremo — certa ou errada em relação ao seu conteúdo — foi tomada integralmente de acordo com a Constituição e respeitando os limites institucionais das competências atribuídas à Corte. Já as ameaças de que havia chegado ao limite e que não haveria mais conversa e exigiria o cumprimento da Constituição não encontram nenhum respaldo no texto constitucional. Afinal, não se admite ao Presidente da República que reforme decisões judiciais nem diga aos juízes como devem interpretar a lei ou a Constituição. Ao Supremo Tribunal Federal é assegurada a última palavra no que se refere à interpretação das normas constitucionais.
Em razão de nova referência às Forças Armadas, o Ministro da Defesa acabou divulgando outra nota oficial em que asseverou que “as Forças Armadas cumprem a sua missão Constitucional” e que “são organismos de Estado, que consideram a independência e a harmonia entre os Poderes imprescindíveis para a governabilidade do País” (DEFESA, 04/05/2020). Foi a segunda nota em menos de um mês do Ministério da Defesa para afirmar que as Forças Armadas cumprem o seu papel constitucional, o que já demonstra, por si só, o esgarçamento institucional em que — involuntariamente, diga‑se — se vêm envolvidas.
Já no final de maio, após operação da Polícia Federal determinada pelo Supremo Tribunal Federal — em inquérito que investiga a existência de organização para promover disseminação de fake news, com objetivos políticos e de ataque a autoridades públicas, especialmente do Supremo Tribunal Federal —, o Presidente demonstrou grande irritação e exclamou, de maneira indignada, diante de diversos representantes da imprensa: “Acabou!”, seguido de um palavrão, antes de completar: “Ontem foi o último dia. Eu peço a Deus que ilumine as poucas pessoas que ousam se julgar melhor e mais poderosas do que os outros, que se coloquem no seu devido lugar” (G1, 28/05/20). Esse foi o segundo ultimato disferido pelo Presidente da República ao Supremo, afirmando que não toleraria novos atos que, segundo sua compreensão, violariam os seus próprios poderes. É bem verdade que, em nenhum momento, o Presidente da República praticou efetivamente algum ato de desrespeito a decisões dos demais poderes. Sempre as acatou e as tratou institucionalmente no plano formal. O discurso proferido, no entanto, já encerra gravidade significativa, especialmente porque, como se tem observado, acirra a indignação dos grupos que o apoiam e os ânimos em geral, incentivando protestos cada vez mais agressivos e ameaçadores aos integrantes dos demais poderes, tanto nas redes sociais, como em eventos nas ruas.
O discurso presidencial e de seus apoiadores é bastante confuso. De um lado, expressa a sua indignação contra um fenômeno que, certamente ocorre no Brasil, embora não tenha se originado por aqui, que costuma ser tratado como ativismo judicial. Trata-se de reconhecer ao juiz o papel de controlador não só da legalidade, mas também da legitimidade das decisões dos demais poderes, analisando a razoabilidade e a proporcionalidade dos atos que praticam. Os defensores desse ativismo judicial sustentam que se deve atribuir força vinculante aos princípios jurídicos e reconhecer a missão do Poder Judiciário de proteger os direitos fundamentais e a dignidade da pessoa humana, abandonando-se concepções meramente formalistas do Direito, reconhecendo-se maior amplitude do papel atribuído aos juízes (FALLON, 1997, pp. 29 e 30) e admitindo-se uma força criativa de normatividade para as suas decisões (BARROSO, 2017, p. 102). Os adeptos desse ativismo judicial, atribuem aos juízes a missão de manter a legitimidade do direito por meio da sua adaptação à nova realidade, manter vivo o direito ao tempo de sua aplicação, de acordo com as circunstâncias contemporâneas (FALLON, 1997, pp. 46 e 47). As raízes desse ativismo judicial talvez possam ser encontradas no julgamento do caso Marlbury vs. Madison (5 U.S. 137), pela Suprema Corte dos Estados Unidos, em 1803, quando pela primeira vez se afirmou — sem que isso estivesse expresso no texto constitucional estadunidense — o poder dos juízes de controlar o exercício do poder político, afastando a aplicação de leis ou de atos praticados por autoridades do governo, quando os repute incompatíveis com a constituição.
Há certamente quem se oponha a esse alargamento progressivo do poder dos juízes e defenda a necessidade de uma maior deferência com as decisões administrativas, muitas vezes de caráter político, ou técnico, que normalmente precisam levar em consideração aspectos muito mais amplos do que os fatos levados ao conhecimento do juiz. Outros, apesar de admitirem esse alargamento contemporâneo da atuação judicial, apontam excessos que devem ser combatidos. De modo a tentar ilustrar as diversas tendências que se apresentam e se intercalam como dominantes em diferentes situações e momentos históricos, Cass Sunstein (SUNSTEIN, 2014, pp. 436 a 446) identifica quatro personas que as corporificam: o herói, que acredita piamente no poder transformador do Poder Judiciário e está sempre pronto a defender teorias ambiciosas para afastar a aplicação de leis e atos administrativos; o soldado, que é sempre deferente às determinações superiores e é sempre deferente às decisões, sem questioná-las; o consevador (inspirado na figura de Edmund Burke), que admite certa discricionariedade judicial, mas a ser exercida com cautela, apenas quando essenciais para assegurar avanços incrementais e, por fim, os mudos, que preferem o silêncio e evitam decisões difíceis, contornando-as.
A discussão é bastante complexa e profícua e se trata de um debate ainda em curso, que tende a levar ao aperfeiçoamento dessas relações institucionais. Não se observa, no entanto, em geral, que essa questão seja tratada como “conspiração” dos juízes, tentativa de golpe, nem sob ameaças de que o Poder Executivo não admitirá novas investidas, que reagirá à altura, que fará cumprir a Constituição — que é o papel primordial do Supremo Tribunal Federal — ou, como visto, conclamando juízes a se “colocarem no seu devido lugar”. Qual seria esse lugar? Já que, essencialmente, é papel do Judiciário exercer o controle da ação dos governantes, a assertiva do Presidente da República parece apenas uma intenção de enquadrar seus controladores e intimidá-los, o que ganha ares de maior gravidade pelas constantes referências às Forças Armadas, aparentando que se pretende acenar com aparato bélico de que dispõem, para acanhar os juízes no exercício de suas funções constitucionais, diante do temor da força armada, o que seria um enorme despropósito em um mundo civilizado.
O Presidente da República chegou a afirmar que “ordens absurdas não se cumprem” (Isto é Dinheiro, 28/05/20). Apesar de suas afirmações se manterem sempre no plano da retórica, não se espera de um Presidente da República que celebre a desobediência civil, muito menos quando se refere a decisões de outros poderes constituídos. Declarações de membros da família, como a de um de seus filhos, em seguida à operação policial que teve como alvos algumas pessoas identificadas como apoiadores do Presidente, no sentido de que pode haver necessidade de adoção de “medida enérgica” pelo pai, tendo feito referência expressa a um “momento de ruptura”, cuja ocorrência não seria mais uma questão de “se”, mas sim de “quando” (G1, 28/05/20), também não contribuem para a desejada harmonia e independência entre os poderes.
Tendo em vista o histórico de rupturas institucionais no Brasil que muitas vezes, no passado, tiveram participação das Forças Armadas, manifestações de militares que tomem partido nesses embates institucionais entre os poderes constituídos são indesejáveis e podem gerar situações delicadas. Essa é uma das razões pelas quais ganhou grande repercussão nota oficial do general Augusto Heleno que, embora esteja na reserva e não se pronuncie em nome das Forças Armadas, ocupa o relevante cargo de Ministro do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República (GSI). Na nota, o ministro se referia a pedido formulado em um inquérito quanto à apreensão do telefone celular do Presidente, que seria apreciado pelo Ministro-relator no Supremo Tribunal Federal e advertia que “caso se efetivasse, seria uma afronta à autoridade máxima do Poder Executivo e uma interferência inadmissível de outro Poder, na privacidade do presidente da República e na segurança institucional do país”, o que poderia provocar “consequências imprevisíveis para a estabilidade nacional” (Agência Brasil, 22/05/20).
Nesse ponto, é relevante observar que o artigo 102, I, b da Constituição atribui ao Supremo Tribunal Federal a competência para processar e julgar o Presidente da República por cometimento de crimes comuns. É verdade que, no artigo 86, se exige que a acusação seja previamente admitida por votação de dois terços da Câmara dos Deputados, para que o julgamento possa ocorrer. No entanto, essa restrição não impede o curso das investigações, mesmo porque a decisão quanto à admissão de uma eventual acusação pela Câmara dependerá da instrução do inquérito e da obtenção das provas. Nesse sentido já firmou sua jurisprudência o Supremo Tribunal, desde 1993, quando quedou esclarecido que tal imunidade constitucional “não impede que sejam ordenadas e praticadas, (...) na fase pré-processual do procedimento investigatório, diligências de caráter instrutório destinadas a ensejar a informatio delicti e a viabilizar, no momento constitucionalmente oportuno, o ajuizamento da ação penal” (STF, Inq 672). A providência aventada, portanto — a qual, diga-se, sequer chegou a ser deferida —, estava perfeitamente inserida nos poderes instrutórios constitucionalmente atribuídos ao Supremo Tribunal Federal nas investigações penais em face do Presidente da República e em nada configuraria afronta ao outro Poder, caso tivesse sido deferida. Mais uma vez, trata-se de irresignação dirigida não em face da extensão das atribuições judiciais, mas sim contra o possível conteúdo da decisão, o que restou claro, dias depois, quando o Presidente da República manifestou publicamente sua aprovação à medida instrutória de natureza muito semelhante, dessa vez autorizada pelo Superior Tribunal de Justiça em face do governador do Estado do Rio de Janeiro, com operações de busca e apreensão realizadas no Palácio de governo e em sua residência (G1, 26/05/20).
Chama especialmente a atenção, nesse contexto de esgarçamento institucional, os constantes comparecimentos do Presidente da República a eventos nos quais ocorrem manifestações antidemocráticas, com exaltações a ações de intervenção militar e fechamento do Parlamento ou do Supremo Tribunal Federal, além das constantes referências feitas pelo próprio Presidente ao apoio que detém das Forças Armadas, tendo levado à divulgação de duas notas públicas do Ministério da Defesa em cerca de um mês. Apesar de as Forças Armadas brasileiras terem atingido atualmente um estágio de alta profissionalização e uma grande maturidade institucional, gozando de grande prestígio na sociedade brasileira, não tendo praticado nenhum ato censurável, a simbologia do comportamento presidencial assusta pela sombra que carrega de um passado absolutamente indesejado de cerceamento da democracia por meio do emprego da força militar a que o país foi um dia acostumado. Sabemos todos que se trata de tempos idos e que dificilmente retornarão. Por isso mesmo, causa perplexidade o surgimento de interpretação exótica do artigo 142 da Constituição que recentemente tem sido veiculada.
Uma interpretação muito esquisita do art. 142 da Constituição
Na semana passada, o Presidente da República divulgou, em uma de suas redes sociais, um vídeo em que o professor Ives Gandra Martins discorria sobre “a politização no STF e a aplicação pontual da 142”. Poucos dias depois, o professor publicou artigo no Consultor Jurídico intitulado “Cabe às Forças Armadas moderar os conflitos entre os Poderes”. Em seu artigo, essencialmente defende uma leitura do artigo 142 da Constituição pela qual a atribuição conferida às Forças Armadas para atuar na garantia da lei e da ordem autorizaria que “se um Poder sentir-se atropelado por outro, poderá solicitar às Forças Armadas que ajam como Poder Moderador para repor, naquele ponto, a lei e a ordem, se esta, realmente, tiver sido ferida pelo Poder em conflito com o postulante” (MARTINS, 2020).
A primeira e evidente objeção que se pode apresentar a tal proposição é que as Forças Armadas, evidentemente, não são um Poder. São instituições nacionais permanentes, que se encontram sob a autoridade suprema do Presidente da República, que é o seu comandante maior, conforme a dicção dos artigos 84, XIII e 142 da Constituição. Não faria nenhum sentido, portanto, que sendo subordinada aos poderes constituídos e encontram-se sob o comando de um deles, coubesse às Forças Armadas mediar algum conflito entre eles.
A aventada ideia de existência de um Poder Moderador advém de configuração um tanto esdrúxula e inusitada adotada pela Constituição do Império, de 1824. Nesse sentido, não custa recordar o contexto histórico no qual foi outorgada tal Constituição. Em seguida à declaração de independência do Brasil — que buscou arrefecer as insurreições que eclodiam por diversos cantos do país em busca de autodeterminação para a então colônia portuguesa (NEVES, 2011, pp. 99 a 111) —, o próprio D. Pedro I convocou a Assembleia Constituinte, que se reuniu pela primeira vez em 1823. No discurso que proferiu na sessão de abertura da Constituinte, D. Pedro pronunciou as seguintes palavras (BONAVIDES e ANDRADE, 1991, p. 25):
Como imperador constitucional, e mui principalmente como defensor perpétuo deste império, disse ao povo no dia 1º de dezembro do ano próximo passado, em que fui coroado e sagrado, que com a minha espada defenderia a pátria, a nação e a Constituição, se fosse digna do Brasil e de mim.
Posteriormente, descontente com os rumos que a constituinte tomava, o Imperador decretou a sua dissolução e cercou o prédio da Assembleia com suas tropas, tendo feito prisioneiros alguns deputados. Depois disso, outorgou, em 25 de março de 1824, a nova Carta, a qual “não emanava da representação da nação, mas era concedida pela magnanimidade do soberano, tendo sido elaborada por um Conselho de Estado, instituído pelo imperador (NEVES, 2011, pp. 99 a 104).
É essa Carta que, no seu artigo 98, prevê a existência de um Poder Moderador — “chave de toda a organisação Política” —, que seria exercido pelo próprio imperador que outorgara a Constituição, oferecendo-a ao povo e mandando observá-la, como fez constar da Carta de lei que lhe deu vigência. No artigo 99, afirma-se ainda que “a Pessoa do Imperador é inviolável, e Sagrada”, não estando sujeito a responsabilidade alguma. Já durante o segundo reinado, assim se pronunciou Tobias Barreto sobre esse heterodoxo instituto, que não encontra par em outras tradições democráticas: “pretende-se hoje que não há responsabilidade para os atos do Poder Moderador; é que o Poder Moderador, filho do direito divino, não tem no exercício de suas funções outra sanção senão o foro interno, para não dizer o capricho da prestigiosa individualidade a quem é delegado” (OTONI, 1860, pp. 31 e 32).
Ora, apenas em um ambiente político deste tipo é possível sustentar a existência de um Poder Moderador, que é necessariamente superior a todos os outros e mesmo à própria Constituição, que é ela própria outorgada por sua graça. Só assim pode dispor da autoridade necessária para apontar os limites dos demais poderes — a ele subordinados — e reprimir eventuais excessos que identifique em seu proceder.
No sistema de tripartição de poderes, harmônicos e independentes entre si, adotado pelo Brasil e por tantos outros países democráticos não há espaço para uma autoridade superior de que os Poderes dependam para o exercício de suas atribuições. O equilíbrio almejado terá que ser encontrado em meio aos confrontos e tensões naturais, que necessariamente estarão presentes nesse jogo de poder e será a resultante obtida pelo encontro das forças exercidas por cada um. Mais do que algum grande jurista, vale referir aqui à bela proposição formulada por um militar, o general Carlos Alberto dos Santos Cruz, que além de já ter exercido o cargo de Ministro da Secretaria de Governo da Presidência, foi comandante da missão de paz no Haiti e da missão de estabilização das Nações Unidas na República Democrática do Congo, tendo, portanto, grande experiência em interações entre forças militares e políticas. Nas suas palavras, “a busca da harmonia é obrigatória aos três Poderes”. Trata-se de uma obrigação constitucional, que de forma nenhuma é impedida pela existência de discordâncias e conflitos, que são inerentes à relação que se vai estabelecer entre eles, maiores ou menores em cada momento histórico, mas sempre existentes. E conclui o general (CRUZ, 2020):
As diferenças, o jogo de pressões e as tensões são normais na democracia e as disputas precisam ocorrer em regime de liberdade, de respeito e dentro da lei. Por isso mesmo, a Constituição Federal se sobrepõe aos três Poderes da República para limitar seu emprego, para disciplinar seu exercício. É nesse processo que os três Poderes moderam sua atuação, encontram seus limites e definem as condições de emprego dos demais instrumentos do Estado, inclusive as Forças Armadas, na implementação de políticas públicas.
Não faz sentido pretender-se que qualquer outra instituição deva tutelar as relações entre os três poderes, mediando os seus conflitos ou impondo-lhes ajustes, tomando partido ou apontando-lhes as soluções que lhe pareçam mais corretas. As eventuais disputas que se ponham entre os Poderes precisam ser resolvidas por eles mesmos, “em regime de liberdade”, cabendo apenas a eles, em conjunto, e a nenhuma força exógena, a moderação de sua própria atuação. Apenas a Constituição se sobrepõe aos três Poderes da República.
Se não fosse suficientemente absurda e claramente contrária ao texto constitucional a pretensão de um Poder Moderador a ser exercido pelas Forças Armadas — comandadas pelo Presidente da República, que é o chefe de um dos Poderes —, a exótica sugestão não encontra o mínimo respaldo nas capacidades institucionais desenhadas pelo Constituinte para as Forças Armadas. Nesse sentido, uma das características mais marcantes do Estado Constitucional é a subordinação das instituições estatais ao Direito, por meio da distribuição de competências específicas a cada uma delas, cujo desenho institucional deve proporcionar que reúnam as capacidades necessárias para o seu exercício.
Devem-se evitar, portanto, interpretações da norma que a levem à atribuição de competências para uma determinada instituição para as quais não estão capacitadas, especialmente quando haja outras instituições mais especificamente capacitadas para o exercício destas mesmas competências. O que se pretende sustentar, pode soar como óbvio: as instituições devem agir em conformidade com as suas capacidades institucionais, ou seja, de acordo com o desenho institucional que lhes confere a lei. As Forças Armadas são organizadas com base na hierarquia e na disciplina e treinadas para responder a agressões externas e manter a ordem internamente, garantindo o exercício dos poderes constitucionais.
Há atualmente diversos projetos de enorme relevância em desenvolvimento pelas Forças Armadas, entre os quais o programa nuclear da Marinha, que inclui a incorporação à Força Naval de submarinos de propulsão nuclear e o Projeto F-X2 para a aquisição de aeronaves de caça supersônicas para a Força Aérea, que são essenciais para o reforço da capacidade de defesa e dissuasão contra eventuais ataques ao país; o projeto SisGAAz, para a ampliação do monitoramento da Amazônia Azul e o projeto Sisfron, do Exército brasileiro, para a instituição de um sistema integrado de monitoramento das nossas fronteiras, que são essenciais para garantir o exercício da soberania brasileira sobre o seu território e suas águas territoriais; além do projeto Proteger, também desenvolvido pelo Exército, que tem significativa relevância para os esforços de preservação ambiental, pelo incremento que pretende produzir na capacidade de vigilância sobre o território nacional, igualmente relevante para a proteção de nossa infraestrutura instalada, como hidrelétricas, portos, aeroportos, ferrovias etc. e também para a prevenção a eventuais ataques terroristas.
No que diz respeito à garantia dos poderes constitucionais, as Forças Armadas funcionam, nas palavras de Seabra Fagundes, como “garantes materiais da subsistência do Estado e da perfeita realização dos seus fins” (FAGUNDES, 1947, p. 2). Em documento intitulado “Cenário da Defesa 2020-2039” (DEFESA, Cenários, 2017, p. 40), o Ministério da Defesa, ao tratar de uma perspectiva hipotética de instabilidade político-institucional brasileira, assim se pronuncia sobre o papel que as Forças Armadas teriam a desempenhar:
Devido à situação político-institucional, parcela significativa da população poderia se revoltar contra a classe política e demandar mudanças, gerando violência, o que, provavelmente, colocaria as Forças Armadas na cena política por força do Art. 142 da Constituição Federal (garantia dos poderes constitucionais).
Como se vê, há uma perfeita compreensão do Ministério da Defesa, de que o papel das Forças Armadas é de proteção e garantia dos poderes constitucionais em toda a sua abrangência, devendo respeito e obediência aos três, embora sejam comandadas pelo Presidente da República. Trata-se de proteger os poderes contra ameaças que venham a sofrer de terceiros. Não se trata de protegê-los uns dos outros. Não há hipótese, portanto, de sua intervenção para resguardar as competências de um contra suposta invasão cometida por outro.
No que diz respeito ao seu papel na garantia da lei e da ordem dentro do território nacional, a Lei complementar nº 97/1999 estabelece no artigo 15, §2º que após esgotados os instrumentos de segurança pública previstos no artigo 144 da Constituição — que incluem as forças policiais federais e estaduais —, a atuação das forças armadas poderá ser autorizada por decisão do Presidente da República (artigo 15, §1º), “de forma episódica, em área previamente estabelecida e por tempo limitado”. Exige-se, ainda, pela redação do artigo 15, §3º que o governador do Estado onde ocorrem os distúrbios reconheça expressamente o esgotamento das alternativas policiais para o enfrentamento do problema. Como se vê, portanto, não se admite que a União empregue as Forças Armadas para a garantia da lei e da ordem, no território de determinado Estado da federação, sem a anuência do seu governador. Do mesmo modo, não faria sentido que algum dos Poderes pudesse fazê-lo para interferir na atuação de outro Poder, à sua revelia.
Além disso, é relevante observar que as capacidades institucionais das Forças Armadas estão dirigidas para a interpretação do cenário geopolítico internacional, o desenvolvimento de ações estratégicas de defesa e dissuasão e, como último recurso, o emprego da força bruta e do poderio bélico para o controle de situações que o imponham. De modo nenhum se admite o emprego desse poder militar para interferir em assuntos políticos (uma das principais razões para se manter a disciplina militar, segundo FAGUNDES, 1947, p. 8). A esse respeito, vale recordar as palavras ditas pelo general Hamilton Mourão, atual vice‑Presidente da República, quando tratava da politização e sindicalização da polícia militar de alguns Estados: “Eu fico imaginando isso dentro do Exército. Teríamos a associação dos generais, que seria poderosíssima, né?!” e completou: “se a política entra pela porta da frente de um quartel, a disciplina e hierarquia saem pela porta dos fundos” (BRPOLÍTICO, 1º/03/20). Como se vê, o envolvimento das Forças Armadas em assuntos de natureza política é incompatível com o seu próprio desenho institucional.
Não faria nenhum sentido, portanto, mesmo desconsiderando todas as diversas outras objeções a essa ideia, que se pretendesse selecionar as Forças Armadas como a instituição a controlar os limites de atuação de cada um dos três Poderes, já que sua configuração não prevê esse tipo de capacitação institucional. Imagine-se, assim, uma situação em que, o Supremo Tribunal Federal interpretasse a Constituição de um modo que provocasse violento desagrado no Presidente da República, a ponto de levá-lo a se recusar ao cumprimento da decisão. Nesse caso, então, caberia ao chefe do Poder Executivo tomar a iniciativa de chamar as Forças Armadas para decidir o impasse? Deveriam, então, as forças militares examinar a questão jurídica posta e concluir a quem cabe a razão? Ora, qual a autoridade mais capacidade para interpretar a Constituição: o Supremo Tribunal Federal ou as Forças Armadas? (The central question is not "how, in principle, should a text be interpreted?" The question instead is "how should certain institutions, with their distinctive abilities and limitations, interpret certain texts?", SUSTEIN e VERMEULE, p. 886) A lista de absurdos decorrentes dessa hipótese é interminável. Caso se responda positivamente a tais questões, o intérprete último da Constituição seriam então as Forças Armadas, que estariam dotadas de poder para reformar as decisões do Supremo Tribunal Federal. Um problema se poria desde logo: como executar esse poder reformador? Não se imagina que alguma autoridade militar vá despachar nos autos do processo judicial e proferir decisão em grau recursal. Como recordam Diego Werneck Argueles e outros (ARGUELES et alii, 2020), não “existe previsão constitucional de recurso às forças armadas contra decisão judicial — estranha invenção de quem não entende ou não aceita a diferença entre força e direito”.
Em seu artigo, Ives Gandra aventa a hipótese de um conflito entre o Congresso e o Supremo Tribunal Federal, diante de uma decisão judicial que, ao reconhecer uma omissão legislativa, ao invés de apenas declará-la, passe a ditar a norma aplicável. Segundo o professor, diante de “tal invasão de competência não poderia recorrer ao próprio STF invasor”. Caberia, então, ao Congresso “recorrer às Forças Armadas para a reposição da lei (CF) e da ordem, não dando eficácia àquela norma que caberia apenas e tão somente ao Congresso redigir” (MARTINS, 2020). Não esclarece, todavia, qual seria o mecanismo aplicável. O autor apenas menciona que a atuação seria pontual e jamais para romper, mas sim para repor a ordem “tisnada pela Suprema Corte”, mas não explica como isso se daria. No sistema adotado pela Constituição imperial de 1824, cabia ao Poder Moderador, supremo e despótico, dissolver a Câmara dos Deputados e suspender os magistrados, como previam os incisos V e VII do artigo 100. Evidentemente nenhuma medida sequer aproximada dessas seria tolerável à luz da Carta democrática de 1988.
É ainda difícil de imaginar como poderiam os Poderes Legislativos e Judiciário se valer das Forças Armadas na defesa das suas próprias prerrogativas em face do Presidente da República. Embora o artigo 142 assegure aos três poderes a iniciativa de mobilizá-las para a garantia da lei e da ordem, seu comandante supremo é o Presidente da República, a quem cabe o poder de nomear o Ministro da Defesa, os Comandantes das três forças, promover seus oficiais-generais e nomeá-los para os cargos que lhe são privativos, por força do que determina o artigo 84, XIII da Constituição. Fica evidente, portanto, que tal comando constitucional põe as forças armadas à disposição de qualquer um dos três poderes para os fins estabelecidos no texto constitucional, que não podem incluir o seu emprego em detrimento de nenhum dos demais Poderes, pois não faria qualquer sentido que as forças armadas fossem compelidas por outros poderes a enfrentar o seu comandante supremo, que é o Presidente da República, repreendendo suas ações ou determinando-lhe correções de rumo.
Por outro lado, se as capacidade institucionais das Forças Armadas são voltadas para o emprego do poder bélico e uso da força contra o inimigo externo ou para recobrar a ordem pública e o império da lei, diante de distúrbios não controláveis pelas forças de segurança pública; as capacidades institucionais dos Poderes Legislativo e Judiciário não comportam o comando de uma força militar, tanto que o artigo 142, mesmo quando autoriza a iniciativa desses poderes para o seu emprego, resguarda que a sua atuação se dará sob a autoridade suprema do Presidente da República, o que resta claro também na redação do artigo 15, §1º da Lei complementar nº 97/1999. Ou seja, não é porque tenha partido de outro poder a iniciativa para a mobilização das Forças Armadas que o seu comando lhe deva ser atribuído. A atuação das Forças Armadas se dará sempre sob as ordens do Presidente da República. Sobre essas características, especialmente no caso do Poder Judiciário, vale recordar as palavras expressadas por Nelson Hungria em seu voto quando do julgamento de mandado de segurança impetrado por Café Filho, que estava sendo mantido enclausurado em sua residência, sob a vigilância do Exército, de modo a impedi-lo de reassumir a Presidência da República, então exercida interinamente por Nereu Ramos (STF, MS 3557):
Jamais nos encalcamos leões. Jamais vestimos, nem podemos vestir, a pele do rei dos animais. A nossa espada é um mero símbolo. É uma simples pintura decorativa, no teto ou na parede da sala de justiça. Não pode ser oposta a uma rebelião armada. Conceder mandado de segurança contra esta seria o mesmo que pretender afugentar leões autênticos sacudindo-lhes o pano preto de nossas togas.
A segurança foi denegada naquela ocasião, pois como alertou o Ministro Nelson Hungria em seu voto “tanques e baionetas estão acima das leis, da Constituição e, portanto, do Supremo Tribunal Federal”. Deste modo, pretender empregar a força militar para neutralizar o exercício das funções jurisdicionais por um tribunal não pode ser visto, de modo algum, como uma alternativa jurídica ou o exercício legítimo de um Poder Moderador constitucional. A imposição da força bruta sobre qualquer dos poderes significará sempre uma ruptura da ordem constitucional e jurídica do país; o abandono do direito em detrimento de uma trágica solução hobbesiana, em que prevalece aquele que fala mais alto e se impõe pelas armas ao invés da razão. Como bem asseveram Diego Werneck e outros (ARGUELES et alii, 2020), “a Constituição só admite crítica desarmada”. O mesmo se pode dizer quando à atuação constitucional dos três poderes. Qualquer solução diferente dessa não se apresenta como legítima, por maiores que sejam os esforços contorcionistas para lhes emprestar legitimidade institucional. Não passará do mais sórdido golpe e deverá merecer todo o repúdio da sociedade brasileira.
Referências bibliográficas e documentais
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CRUZ, Carlos Alberto dos Santos. O Militar e a Política: as Forças Armadas, por serem instituições de Estado, não devem fazer parte da dinâmica de assuntos de rotina política. Estadão de 28 de maio de 2020. Disponível em: https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,o-militar-e-a-politica,70003317763.
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MONTESQUIEU [Charles-Louis de Secondat, baron de la Brède e de Montesquieu]. De l'esprit des lois. Norp-Nop editions, 2011, edição do Kindle, posição 2885, disponível em www.amazon.com)
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SUSTEIN, Cass R. e VERMEULE, Adrian. Interpretation and Institutions. The Michingan Review, vol. 101, nº 4, fev. 2003, p. 886.
Referências de mídia (em ordem de aparição no texto)
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Após demitir Mandetta, Bolsonaro acusa Maia de conspiração: “Parece que a intenção é me tirar do governo” (InfoMoney, em 16 de abril de 2020). Disponível em: https://www.infomoney.com.br/politica/apos-demitir-mandetta-bolsonaro-acusa-maia-de-conspiracao-parece-que-a-intencao-e-me-tirar-do-governo/
Forças Armadas trabalham por estabilidade e obedecem à Constituição, diz Defesa (Folha de São Paulo, em 20 de abril de 2020). Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/poder/2020/04/forcas-armadas-trabalham-por-estabilidade-e-obedecem-constituicao-diz-defesa.shtml
Decisão de Moraes quase causou crise institucional, diz Bolsonaro (AgênciaBrasil, em 30 de abril de 2020). Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2020-04/decisao-de-moraes-quase-causou-crise-institucional-diz-bolsonaro
Bolsonaro se reuniu com cúpula das Forças Armadas na véspera de ato com pauta antidemocrática (O Globo, em 03 de maio de 2020). Disponível em: https://oglobo.globo.com/brasil/bolsonaro-se-reuniu-com-cupula-das-forcas-armadas-na-vespera-de-ato-com-pauta-antidemocratica-24408691
Bolsonaro participa de manifestação e diz que não irá 'mais admitir interferência' (Estadão, em 03 de maio de 2020). Disponível em: https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,bolsonaro-participa-de-manifestacao-e-diz-que-nao-ira-mais-admitir-interferencia,70003290849
Bolsonaro diz que vai nomear novo diretor da PF nesta segunda-feira (Correio Braziliense, em 03 de maio de 2020). Disponível em: https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/politica/2020/05/03/interna_politica
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Poderes têm de entender limite da responsabilidade de cada um, afirma Mourão em crítica ao STF (GaúchaZH, em 04 de maio de 2020). Disponível em: https://gauchazh.clicrbs.com.br/politica/noticia/
2020/05/poderes-tem-de-entender-limite-da-responsabilidade-de-cada-um-afirma-mourao-em-critica-ao-stf-ck9sov1f6003e015nrzq23nhj.html
Em crítica ao STF, Mourão diz que escolha de auxiliares e decisões sobre política externa são atribuições de Bolsonaro (O Globo, em 04 de maio de 2020). Disponível em: https://oglobo.globo.com/brasil/em-critica-ao-stf-mourao-diz-que-escolha-de-auxiliares-decisoes-sobre-politica-externa-sao-atribuicoes-de-bolsonaro-1-24409380.
'Acabou, porra!', diz Bolsonaro sobre ordem do STF para operação policial contra aliados (G1, em 28 de maio de 2020). Disponível em: https://g1.globo.com/politica/noticia/2020/05/28/acabou-porra-diz-bolsonaro-sobre-ordem-do-stf-para-operacao-policial-contra-aliados.ghtml
Bolsonaro: Ordens absurdas não se cumprem, temos que botar limite nessas questões (Isto é Dinheiro, em 28 de maio de 2020). Disponível em: https://www.istoedinheiro.com.br/bolsonaro-ordens-absurdas-nao-se-cumprem-temos-que-botar-limite-nessas-questoes/
Eduardo Bolsonaro vê 'momento de ruptura' e cogita adoção de 'medida enérgica' por presidente (G1, em 28 de maio de 2020). Disponível em: https://g1.globo.com/politica/noticia/2020/05/28/deputado-eduardo-bolsonaro-cogita-necessidade-de-medida-energica-do-presidente.ghtml
Apreensão de celular de Bolsonaro seria afronta, afirma Heleno (Agência Brasil, em 22 de maio de 2020). Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2020-05/apreensao-de-celular-de-bolsonaro-seria-afronta-afirma-heleno
Bolsonaro ri ao ouvir comentário sobre operação contra Witzel e dá parabéns à PF (G1, em 26 de maio de 2020). Disponível em: https://g1.globo.com/politica/noticia/2020/05/26/bolsonaro-ri-ao-ser-questionado-sobre-operacao-contra-witzel-e-da-parabens-a-pf.ghtml
Mourão critica ‘politização’ da polícia (BRPOLÍTICO, em 1º de março de 2020). Disponível em: https://brpolitico.com.br/noticias/mourao-critica-politizacao-da-policia-amotinada/
Referências jurisprudenciais
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STF, MS 3557, Relator Min. Hahnemann Guimarães, Relator para acórdão Min. Afrânio Costa (convocado), Tribunal Pleno, julgado em 07/11/1956, DJ de 04/04/1957, p. 3701
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STF, MS 37097, Relator Min. Alexandre de Moraes, julgado em 08/05/2020, publicado em processo eletrônico DJe-117, divulgado em 11/05/2020 e publicado em 12/05/2020.