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A posição do Conselho Nacional do Ministério Público sobre a contratação de advogado por inexigibilidade de licitação

ANO 2016 NUM 254
Angélica Petian (SP)
Especialista em Direito Administrativo pela PUC-SP. Mestre em Direito do Estado pela PUC-SP. Doutora em Direito pela PUC-SP. Professora de Direito Administrativo. Membro do Instituto Paulista de Direito Administrativo - IDAP. Membro do Instituto Brasileiro de Estudos Jurídicos da Infraestrutura - IBEJI. Advogada na Rubens Naves Santos Jr. Advogados.


13/09/2016 | 5671 pessoas já leram esta coluna. | 3 usuário(s) ON-line nesta página

A contratação de advogado pelo Poder Público, sem licitação, fundamentada no artigo 25, inciso II, da Lei n.º 8.666/93 exige simultaneamente a singularidade do objeto e a notória especialização do profissional ou da sociedade de advogados.

A notória especialização é conceito apresentado pela própria Lei de Licitações, conforme § 1º da Lei n.º 8.666/93:

“Considera-se de notória especialização o profissional ou empresa cujo conceito no campo de sua especialidade, decorrente de desempenho anterior, estudos, experiências, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica, ou de outros requisitos relacionados com suas atividades, permita inferir que o seu trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato”.

O contratado deve comprovar sólida formação acadêmica, demonstrar que se mantém atualizado na matéria e que possui experiência profissional em questões similares que o tornam notoriamente especializado, inclusive com reconhecimento de seus pares, pelo destaque profissional que tem.

Por outro lado, para que a contratação por inexigibilidade satisfaça os requisitos legais, além da notória especialização do profissional, o objeto deve ser singular, marcado por complexidade e importância estratégica que ensejam a atuação de profissional especializado.

A singularidade do objeto não está referida à exclusividade. Não se exige a existência de um único profissional apto a executar os serviços. Em voto que deu origem ao Acórdão n.º 2616/2015, o Ministro do Tribunal de Contas da União, Benjamin Zymler asseverou que “que tal conceito não pode ser confundido com unicidade, exclusividade, ineditismo ou mesmo raridade. Se fosse único ou inédito, seria caso de inexigibilidade por inviabilidade de competição, fulcrada no caput do art. 25, e não pela natureza singular do serviço. O fato de o objeto poder ser executado por outros profissionais ou empresas não impede que exista a contratação amparada no art. 25, inciso II, da Lei 8.666/1993." 

Para o Tribunal de Contas da União “a singularidade de um serviço diz respeito à sua invulgaridade, especialidade, especificidade ou notabilidade, ou seja, a natureza singular se "caracteriza como uma situação anômala, incomum, impossível de ser enfrentada satisfatoriamente por todo e qualquer profissional especializado. Envolve os casos que demandam mais do que a simples especialização, pois apresentam complexidades que impedem obtenção de solução satisfatória a partir da contratação de qualquer profissional" (trecho do voto condutor do Acórdão nº 852/2008-TCU-Plenário).

O Supremo Tribunal Federal tem reconhecido a legalidade da contratação de advogado por inexigibilidade de licitação, presentes os requisitos impostos pela Lei de Licitações. Nesse sentido são os acórdãos proferidos nos autos do HC 86198 e RExt 466705.

Não obstante esse seja o posicionamento do Supremo Tribunal Federal, proliferam ações de improbidade administrativa pela contratação de serviços jurídicos sem licitação. É bem verdade que muitas delas se devem ao não atendimento dos requisitos legais, mas outra parcela, bastante significativa de ações resta fundamentada exclusivamente na suposta impossibilidade de contratar serviços jurídicos por inexigibilidade, dada a pluralidade de profissionais aptos a executar os serviços que garante a viabilidade de competição.

Impende destacar, por oportuno, que a inviabilidade de competição prevista pela lei não reside na unicidade de prestador, hipótese que seria de fornecedor exclusivo, mas na impossibilidade de comparar objetivamente a proposta maios vantajosa para a Administração.

A existência de critérios objetivos de comparação entre os interessados em contratar com a Administração é premissa para a realização de licitação.

Alguns serviços advocatícios singulares não permitem o cotejo entre propostas, uma vez que cada profissional pode apresentar uma estratégia de enfrentamento da demanda diferente dos demais, o que torna inviável a competição.

Vale, ainda, anotar que o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, editou a Súmula n.º 04/2012/COP, nos seguintes termos:

“ADVOGADO. CONTRATAÇÃO. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO. Atendidos os requisitos do inciso II do art. 25 da Lei nº 8.666/93, é inexigível procedimento licitatório para contratação de serviços advocatícios pela Administração Pública, dada a singularidade da atividade, a notória especialização e a inviabilização objetiva de competição, sendo inaplicável à espécie o disposto no art. 89 (in totum) do referido diploma legal”.

O conteúdo da citada súmula está respaldado pelo Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil que veda a mercantilização da advocacia.

Esses argumentos, foram recentemente acatados pelo Conselho Nacional do Ministério Público, que editou a Recomendação n.º 36, de 14/06/2016, por meio da fixou o entendimento de que a contratação direta de advogado ou escritório de advocacia por ente público, por inexigibilidade de licitação, por si só, não constitui ato ilícito ou improbo, pelo que recomenda aos membros do Ministério Público que, caso entenda irregular a contratação, descreva na eventual ação a ser proposta o descumprimento dos requisitos da Lei de Licitação.

A Recomendação, publicada no Diário Eletrônico do CNMP, em 06 de julho de 2016, revela que o Conselho Nacional do Ministério Público, em posicionamento similar ao do Poder Judiciário e do Tribunal de Contas da União colocou o foco da discussão no atendimento dos requisitos legais, como deve ser em um Estado de Direito, no qual a validade dos atos e contratos administrativos está condicionada à sua submissão ao ordenamento jurídico.

Assim, embora a Recomendação não traga novos elementos ao debate, posto que reitera que a repreensão da conduta só pode ocorrer quando há descumprimento da lei, ela deve ser conhecida e comemorada porque prestigia a legalidade, enquanto conformação da ação administrativa com a previsão normativa, noção comezinha e salutar nos dias de hoje.



Por Angélica Petian (SP)

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