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A Administração Pública, o RDC - Regime Diferenciado de Contratação e os contratos de built-to-suit. Novas oportunidades para investidores

ANO 2016 NUM 70
Marcos Sampaio (BA)
Advogado. Mestre em Direito Público pela UFBA. Professor de Direito Constitucional e Administrativo da Universidade Salvador - Unifacs.


30/01/2016 | 10990 pessoas já leram esta coluna. | 3 usuário(s) ON-line nesta página

1. Introdução

No atual contexto social e econômico, dotado de enorme complexidade, a hiper-especialização tornou-se uma realidade inexorável, que acaba por levar particulares e governos, cada vez mais, a delegar aquilo que não esteja estritamente no escopo da sua atividade própria, transferindo e alocando responsabilidades a quem melhor possa desempenhar um determinado mister.

É nesse contexto que uma rede de varejo, verbi gratia, focada no seu core bussiness, revela desinteresse em imobilizar seus recursos (capital, capacidade gerencial, recursos humanos, etc) e em assumir riscos distintos da sua finalidade própria, como àqueles ligados diretamente à aquisição imobiliária, licenciamento, edificação e regularização dos imóveis onde venha a se instalar. Ao mesmo tempo, para alçar maior desempenho operacional, esperam encontrar imóveis padronizados e com características especialmente dirigidas às suas necessidades, tais como dimensão, layout, estruturas, iluminação e acabamentos.

Nesse cenário e conhecendo as limitações próprias dos contratos de locação, sobretudo quanto à facilidade de rescisão por parte do locatário, surgiram os contratos de built to suit (numa tradução livre seria construir para servir, construído para atender às necessidades específicas ou simplesmente locação por encomenda), modalidade contratual largamente difundida no exterior a partir da década de 1950, nos Estados Unidos e na Europa. No Brasil, o interesse pela adoção do built-to-suit teve atenção principalmente a partir da Lei n. 9.514/97 que, ao possibilitar a emissão de recebíveis, expandiu as formas de investimento no mercado de capitais, tornando os negócios imobiliários mais atrativos.

Com maior clareza jurídica, no Brasil, esses contratos apenas vieram a ser regulamentados de forma específica com o advento da Lei 12.744/2012 que, incluiu o artigo 54-A na lei de locações, trazendo regras que privilegiam a autonomia da vontade dos contratantes e romperam com o excessivo protecionismo ao locatário tradicionalmente adotado pela legislação pátria.

No direito administrativo brasileiro, com a edição da Lei 13.190, de 19 de novembro de 2015, foi incluída no Regime Diferenciado de Contratações (RDC — Lei 12.462/11) uma nova hipótese de utilização, pela inserção do artigo 47-A que permitiu a modalidade licitatória diferenciada para contratos de locação de bens móveis e imóveis, nos quais o locador realiza prévia aquisição, construção ou reforma substancial, com ou sem aparelhamento de bens, por si mesmo ou por terceiros, do bem especificado pela administração.

Longe de pretender esgotar assunto tão complexo, o presente artigo se dipõe a fazer uma breve análise do instituto, descrevendo seu campo de utilização e revelando primeiras impressões sobre o tema.

2. Os contratos built-to-suit

Em linhas gerais, no campo de incidência dos contratos built to suit permite que o detentor de valores que lhe permitam investir em um empreendimento de grande porte possa ser contratado por um locatário, geralmente já consolidado no mercado, que pretende obter um imóvel já em condições predeterminadas, específicas para as suas atividades.

Celebrado o ajuste e obtidas todas as especificações e peculiaridades do empreendimento junto ao locatário, o contratado disponibiliza terreno próprio ou passa à aquisição de uma área que atenda aos fins propostos e à posterior construção ou reforma substancial do bem imóvel, nos moldes previstos em contrato, para futura disponibilização ao contratante (locatário).

Trata-se de um negócio multifacetado envolvendo a compra e venda de terreno, a empreitada da obra, a prestação de serviços caracterizada pelo fornecimento de desenhos e projetos iniciais, básico e executivo, a administração da obra e, por fim, a própria disponibilização do imóvel ao beneficiário, pelo prazo contratado.

A hipótese é de típica locação encomendada onde o locatário oferece ao locador suas necessidades e características do bem que será objeto da futura locação. O built-to-suit é o contrato em que uma parte, mediante futura remuneração periódica compatível com a amortização dos investimentos que fará, obriga-se a executar, em imóvel sob o seu domínio, sobre o qual possa construir e explorar, obra encomendada ou sob medida, para dá-la, por um prazo mínimo, ao uso e gozo da outra parte.

Em seu prestigiado dicionário de temos imobiliários, os americanos Jack P. Friedman, Jack C. Harris e J. Bruce Lindeman (Dictionary of Real Estate Terms, 8ª Edition, 2013.) o conceitua como “an arrangement whereby a landowner offers to pay to constructo on his or her land a building specified by a potential tenant, and then to lease land and building to the tenant” indicando que se trata de encomenda para futura locação, de imóvel com especificidade própria e definida pelo futuro locatário.

O contrato built-to-suit é contrato típico, previsto no direito brasileiro, tanto na lei de locações como agora na lei que disciplina o regime diferenciado de contratação pelo poder público, pelo qual o interessado - seja ele particular ou o poder público – em ocupar um imóvel para o desenvolvimento de sua atividade própria contrata um empreendedor imobiliário que (a) adquire uma área em localização estrategicamente selecionada pelo futuro ocupante; (b) constrói um prédio na área para atender as necessidades do interessado e segundo suas especificações; e, (c) celebra contrato locatício da área, segundo as regras contratuais estabelecidas, com regime jurídico próprio.

3. As vantagens dos contratos built-to-suit

A doutrina especializada aponta uma série de vantagens do contrato built-to-suit que podem ser vislumbradas tanto para os particulares quanto para a administração pública.

Com tal modalidade, além de ser plenamente atendido na especificação do bem que procura, o locatário potencializa sua disponibilidade de capital para aplicar na sua atividade finalística, prestigiando seu negócio e, ainda, deixando de efetuar imobilização de recursos e, com isso, melhorando seus índices de liquidez. Tais índices financeiros possuem grande importância para as empresas que participam de licitações públicas, na avaliação da condição financeira da licitante, como preceituado pelo artigo 31, § 5º da Lei Federal nº 8.666/93 e demais alterações posteriores. Além disso, possíveis vantagens financeiras e tributárias podem ser conquistadas, dependendo do regime de tributação adotado pela pessoa jurídica privada.

O locador, por sua vez, investe para atender a necessidade do futuro inquilino e, em compensação, tem a segurança de um contrato firme, com pessoas privadas geralmente bem estabelecidas no mercado ou, agora, com a nova lei, com o poder público. O prazo contratual fixado, a seu turno, deve ser suficiente para compensar o capital investido e permitir que o locador-investidor o recupere, além de perceber os rendimentos compatíveis com a locação.

Dentre as diversas vantagens do built-to-suit, destaca-se (a) não imobilização do ativo; (b) contabilização do pagamento periódico como despesa operacional (a título de despesas de aluguel); (c) atendimento ao padrão construtivo pré-estabelecidas pelo contratante; (d) transferência dos riscos da construção, manutenção e depreciação ao locador; (e) estabelecimento do contrato a longo termo; e (f) autorização legal para a emissão de recebíveis.

Essa modalidade contratual supera a insegurança jurídica do locador, dado que a lei de locação (antes da adoção do contrato especial) permitia ao locatário denunciar imotivadamente a locação, comunicando o locador com trinta dias de antecedência, mesmo que o contrato ainda estivesse vigendo por prazo determinado. Isso aplicado ao built to suit seria extremamente inadequado porque o locador não poderia, depois de proceder a um investimento específico para atender ao locatário, ser surpreendido com o comunicado precoce de devolução do bem.

Por isso, o legislador entendeu de incluir, por meio da Lei nº 12.744/12, a previsão desta espécie de contrato no corpo da Lei de Locações (Lei nº 8.245/91), modificando a redação do art. 4º e inserindo o artigo 54-A, para, em síntese, prever maior liberdade contratual entre as partes, possibilitar a cobrança elevada de multa por devolução antecipada do imóvel e sujeitar o built-to-suit às disposições procedimentais da referida Lei.

Diferentemente do que se percebe nas locações residenciais e mesmo nas locações empresariais tradicionais, o built-to-suit pressupõe a alocação de riscos entre as partes, surgida em contexto de presumida inexistência de simetria econômica ou informacional, o que exige a liberdade contratual como ferramenta a viabilizar a correta equação dessa contratação. Assim, no marco legal do contrato built to suit foi estabelecido, diferentemente dos princípios protetivos ao locatário, maior amplitude à autonomia da vontade, dado que o pressuposto das locações convencionais (vulnerabilidade do locatário) não está presente nos contratos em apreço.

Enfim, se consagrou uma melhor regulação do contrato, permitindo o aumento de negócios dessa modalidade, com marco jurídico mais adequado e seguro, para as duas partes.

4. A incorporação do built-to-suit no direito administrativo brasileiro

Sendo espécie de locação em geral, a doutrina administrativista especializada há muito vem admitindo essa modalidade contratual, antes mesmo da nova lei, a Lei 13.190/15.  A legislação brasileira tinha os contratos de locação build-to-suit como contratos atípicos, deixando de sê-lo com a promulgação da Lei 12.744/12, que modificou a Lei 8.245/91, acrescentando-lhe, entre outras alterações, o art. 54-A. Após isso, nota-se que, no setor público, a “locação sob medida” passou a ser utilizada, ainda que de modo bastante cauteloso pelos gestores.

A adoção de tal contrato com o poder público já foi, diversas vezes, chancelada pela administração pública, e pelos seus diversos órgãos de controle interno e externo, cabendo indicar acórdão do Plenário do Tribunal de Contas da União, TC 046.489/2012-6, como paradigmático pelo ineditismo no enfrentamento naquela Casa.

Anote-se, todavia, que no referido acórdão, a Corte e Contas entendeu que a locação por encomenda teria um caráter subsidiário em relação às outras opções, recomendando, ainda, fosse a mesmo comparada e analisada diante da possibilidade de substituição do negócio por uma potencial parceria público privada - PPP.

Para justificar a estruturação dessa operação no setor público, gestores fundamentam a opção, em essência, na inexistência ou no contingenciamento de dotação orçamentária para aquisição plena de terreno e edificação; no alto custo das reformas realizadas em imóveis alugados pela administração junto ao setor privado sem devolução posterior pelo locador dos valores não amortizados; e na falta de bens que atendam às necessidades de estruturação operacional dos órgãos, de forma a melhor prestarem os serviços públicos.

Com base nisso, e com fundamento na Lei nº 8666/93 que também trata de contratos cujo conteúdo seja regido, predominantemente, por norma de direito privado, inclui-se no espectro governamental a locação em que o Poder Público figure como locatário, nos termos do artigo 62, parágrafo 3º, inciso I da norma geral de licitações e contratos administrativos.

Na prática administrativa brasileira, em geral, a experiência revela um modelo peculiar pelo qual o Poder Público transfere, mediante licitação, o direito de superfície de um imóvel seu ao particular, este realiza a edificação segundo as especificações postas e, após, procede à locação das instalações prediais construídas pelo valor e tempo necessários para a justa remuneração do empreendimento, aí abrangidos os custos e o lucro.

A experiência foi adotada na administração pública para implementar a nova política contornando a ausência de orçamento para construção (investimento) e edificando instalações adequadas aos serviços públicos.

Assim, a operação imobiliária em que a construção do imóvel feita sob medida e demanda do futuro locatário, para que este, em contrapartida, alugue-o depois de construído, por prazo e em condições tais que justifiquem o investimento feito pelo locador, passou a ser admitida no direito administrativo brasileiro.

Evidente que a administração pública deve demonstrar nos autos do processo da contratação built to suit que a opção pela “locação sob medida” mostra-se, sob quaisquer circunstâncias, mais favorável economicamente do que a adoção de outras ações institucionais, tais como, a realização de reforma para adequação de imóvel preexistente, próprio ou de terceiro, ou mesmo a realização de obra pública destinada à construção de prédio novo, em terreno da administração pública ou, ainda, a locação simples.

5. O contrato built-to-suit e a Lei 8.666/93.

No particular, nada obsta que se aplique, para contratação da locação sob medida, a lei geral de licitações, devendo sempre licitar. Todavia, presentes os requisitos, poderá contratar mediante dispensa de licitação, com fundamento no art. 24, inciso X, da Lei nº 8.666/93.

Nesse caso, a licitação pode ser dispensada, mas apenas nos casos em que as necessidades de instalação e de localização condicionem a escolha de determinado imóvel que a Administração pretende buscar a locação e desde que o preço da locação se mostre compatível com o valor de mercado, segundo avaliação prévia, considerando os aspectos próprios e especialíssimos dessa contratação.

A administração pública deve demonstrar claramente o devido cumprimento de todos os requisitos previstos no art. 24, inciso X, da Lei de Licitações, em especial, quanto à comprovação da compatibilidade do preço a ser contratado com o valor de mercado, bem assim que, na encomenda, a junção do serviço de locação (parte principal) com o de execução indireta de obra (parte acessória) apresenta economia de escala.

Um dos aspectos mais relevantes, na análise da economicidade, diz respeito ao valor locatício. Enquanto na locação convencional, o aluguel remunera o uso do imóvel destinado ao locatário, no built to suit o valor pago à título de aluguel deve remunerar, além do uso, também o investimento feito para personalizar o imóvel, ou construí-lo, exclusivamente para atender às necessidades de um inquilino específico. O locador pode até depender de recursos de terceiros para efetivar a construção, sendo comuns operações de financiamento para tal fim, registrando inclusive a possibilidade de utilização preconiza na Lei 9.514/97 de acesso ao Sistema de Financiamento Imobiliário, trazendo consigo um mercado de créditos imobiliários, através da securitização dos mesmos, tornando-se viável, portanto, através da emissão de Certificado de Recebíveis Imobiliários.

O Tribunal de Contas da União, no acórdão do Plenário do Tribunal de Contas da União, TC 046.489/2012-6, deixou bem cristalino que “o preço avençado para a locação sob medida será necessariamente maior que aquele estabelecido para uma locação convencional. Afinal, a contraprestação paga pela Administração Pública deverá não só remunerar o uso do bem pelo Poder Público, mas também deverá permitir a amortização, ainda que parcial, dos investimentos feitos pelo proprietário do imóvel”.

Assim, por consequência, o valor de mercado a ser considerado para efeitos de avaliação do montante a ser pago pela Administração deverá considerar essa especificidade desse tipo de contratação, porque, no cálculo do aluguel mensal deve ser estimado o valor empregado em terreno, projetos, obras, taxas e impostos, assim como o rendimento que esse montante estaria recebendo se estivesse aplicado no mercado financeiro.

Também devem ser observadas, no que couber, as disposições concernentes aos contratos da administração consignadas na Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, destacando que a locação sob medida constitui-se em contrato da administração, e não em contrato administrativo stricto sensu, nos termos do art. 62, § 3º, inciso I, da mesma lei.

Outra questão relevante se refere ao prazo de vigência de um contrato de locação build to suit, que deve durar o tempo necessário para permitir a amortização do investimento inicial realizado pelo locador. Tal constatação não é um obstáculo à celebração desse tipo de contrato, uma vez que a jurisprudência administrativa aponta no sentido de que o limite temporal estabelecido no art. 57 da Lei nº 8.666/1993 não se aplica aos contratos sob comento. Nesse sentido, indicam-se os Acórdãos nº 170/2005 e nº 1.127/2009, ambos do Plenário do TCU.

6. O contrato built-to-suit e o RDC.

A edição da nova regra do regime diferenciado da contratação surge não para passar a permitir o contrato built-to-suit pela administração, mas para permitir que ela contrate segundo seu procedimento simplificado e mais moderno. De todo modo, encerra de vez a discussão quanto possibilidade de utilização do contrato pela administração pública.

A Lei 13.190, de 19 de novembro de 2015, incluiu no Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC — disciplinado pela Lei 12.462/11) essa nova hipótese de utilização aplicável para contratos de locação de bens móveis e imóveis, nos quais o locador realiza prévia aquisição, construção ou reforma substancial, com ou sem aparelhamento de bens, por si mesmo ou por terceiros, do bem especificado pela administração.

Com vigência imediata, do ponto de vista material, a norma além de fixar a possibilidade de locação de bens móveis pelo regime diferenciado de contratação, positivou no direito administrativo a contratação especial, trazendo consigo não apenas a confirmação legalidade da espécie contratual, mas também aplicando ao built-to-suit todas as características da modalidade licitatória, o RDC. Com isso, certamente, deixar-se-á de atribuir a esse contrato o caráter de subsidiariedade preconizado pelo Tribunal de Contas da União.

Logo, pelo regime diferenciado, a locação dessa espécie pode valer-se (i) da a inversão das fases de habilitação e julgamento das propostas – que já era uma realidade no âmbito das contratações públicas no Brasil, mas que, no RDC, passa a ser a regra, e não mais a exceção –, (ii) a expressa permissão ao sigilo do orçamento prévio da Administração para contratação do objeto – a fim de que, sem a presença de preços máximos no Edital das licitações, sejam alcançadas melhores propostas –, (iii) novos critérios de julgamento, dentre estes o "maior retorno econômico", (iv) a contratação integrada, (v) possibilidade de utilização de mediação e arbitragem,  e, ainda, (vi) a possibilidade de contratação de mais de uma empresa para execução de um mesmo objeto, a fim de que se maximize a eficiência da prestação ao Estado, com a criação de um ambiente competitivo intracontratual.

Com a adoção do regime diferenciado como modalidade a ser utilizada na locação sob encomenda, espera-se uma maior agilidade e celeridade na padronização de instalações utilizadas pelo poder público. A partir de então, o se favorecerá que a administração pública realize contratos do tipo 'built-to-suit' para a locação de seus imóveis, com maior segurança jurídica ao avençado com fundamento no artigo 47-A, da Lei 12.462/2011, inclusive podendo haver a reversão dos imóveis para a administração ao final da locação, caso assim dispuser o contrato.

O objeto da locação pode ser bens móveis e imóveis, sendo que para os primeiros, se pode aventar como exemplo a locação de um barco hospital que leve atendimento de saúde a comunidades ribeirinhas onde o acesso se dá por via fluvial. A Administração Pública especifica as características e os equipamentos que a embarcação deve possuir e o particular a constrói disponibilizando depois ao contrato.

Sobre a prévia aquisição prevista no caput do artigo 47-A, nada obsta que o locador já seja, anteriormente, proprietário do bem ou que se comprometa a adquiri-lo para atender ao fim desejado pela administração pública. Também o imóvel pode ser de propriedade da própria administração que, nesse caso, repassa ao contratado o direito de utilizar o bem para edificação (comumente há a concessão do direito de superfície) para, posteriormente, alugar ao poder público. Neste caso, o aluguel será apenas das instalações (a construção realizada) e não o imóvel porque este já pertence ao Poder Público.

O dispositivo legal também admite a contratação quando o bem carecer de construção ou reforma substancial, ou seja, de grande proporção, considerável e que demande inversão de capital. Logo, parece evidente que não se enquadram as simples e pequenas reformas que, a seu turno, permanecem sob o regime geral de licitação e/ou de locação comum.

Por força do §1º do artigo 47-A, o contrato de locação sob encomenda (built to suit) pode ser feito com dispensa de licitação e, nesse caso, segundo o marco legal previsto no art. 24, X, da Lei de Licitações. Assim, embora o procedimento adequado deve ser sempre a realização de licitação pela modalidade do RDC, a contratação built to suit pode ser feita de forma direta.

Outra novidade - e que resolve sérios problemas já enfrentados pela administração - é a possibilidade de reversão dos bens à administração pública ao final da locação, desde que previsto no contrato, conforme o §2º do dispositivo indicado. É claro que essa previsão é implícita na hipótese de locação sob encomenda em imóvel pertencente ao Poder Público. Prevista a reversão, o contrato muito se assemelha com o de arrendamento mercantil (leasing), devendo remunerar a totalidade do investimento, e, certamente, deverá ter um prazo de duração mais alongado.

O § 3º do art. 47-A da Lei nº 12.462/2012, inserido pela Lei nº 13.190/2015, estipula um limite máximo para o valor do aluguel mensal, no caso de locação sob encomenda, o percentual de 1% (um por cento) do valor do bem locado. A limitação a esse percentual vem do reconhecimento do mercado de que o valor médio do aluguel não residencial equivalente à variante de 0,6% (zero vírgula seis por cento) a 1% (um por cento) do valor venal do imóvel, prevalecendo a média de 0,8% (zero vírgula oito por cento).

Tal limitador, a nosso juízo, é despropositado. Isso porque o valor do aluguel dever ser calculado pelo fluxo de renda futura a ser auferida pela cessão do uso e gozo do novo imóvel ou, em outras palavras, o aluguel não visa apenas remunerar o uso do imóvel, mas também amortizar os investimentos efetuados pela concretização do negócio. Nesse caso, para ser interessante ao investidor, esse valor deveria ser maior que o percentil indicado, razão porque a limitação parece ser incompatível com o direito de propriedade e com a livre iniciativa, ambos previstos expressamente na CF/88.

Por fim, na hipótese de rescisão antecipada, caberia a estipulação não de apenas uma multa locatícia, mas de indenização integral pelo investimento realizado segundo as especificações ofertadas pela Administração, acrescida dos lucros cessantes. Evidentemente, a indenização terá como teto a soma dos valores dos aluguéis que o locador teria a receber até o final da locação.

7. Conclusão

O quadro acima traçado revela os propósitos e a utilidade da contratação built-to-suit para a administração e para a sociedade, abrindo uma boa oportunidade de investimento aos particulares, com remuneração certa – ainda que limitada – e segurança jurídica para propiciar a edificação e o desenvolvimento imobiliário nacional.

Apesar das semelhanças com as parcerias público privadas, na locação sob medida, após construir ou reformar o bem, o particular não presta mais nenhum serviço à Administração Pública, figurando apenas como locador.

Apesar da provisória suspensão de eficácia de diversos dispositivos da Lei 13.190/2015, por decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, no mandado de segurança número 33.889-DF, relatado pelo Ministro Roberto Barroso sob o fundamento de ter havido contrabando legislativo, nada impede que a administração continue celebrando o contrato built-to-suit, valendo-se da dispensa de licitação ou de outras modalidades previstas na lei geral, até que resolvida definitivamente a questão. Até lá, o regime diferenciado de contratação deve aguardar o desfecho judicial para que possa ser utilizado nessas contratações.



Por Marcos Sampaio (BA)

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